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quinta-feira, 27 de julho de 2017

Recepção de um Justo


  Recepção de um justo
Reformador (FEB) 15.4.1906

            A epígrafe é nossa. Adaptamo-la por exprimir o fato que se passou no Grupo Ismael (1), logo após a desencarnação do querido companheiro Domingos Filgueiras (2).
           
            Trata-se, com efeito, da recepção que teve no espaço esse humilde e desinteressado servidor do Cristo, verificando-se assim os nossos vaticínios acerca das festas, de que tudo, de resto, fazia prever que seria ele alvo em seu regresso à pátria universal.

            Dando publicidade ao que se passou nessa comovedora sessão, temos em vista proporcionar aos nossos confrades um novo motivo de edificação, que o será ao mesmo tempo de estímulo para quantos pelejamos nestas incruentas pugnas do Espiritismo e que assim podemos ter a antecipada certeza de que o nosso pequenino esforço é contemplado e abençoado pelo céu, e de que é sempre imenso, compensador das amarguras a que não raro nos expomos, o galardão reservado aos que sabem perseverar até o fim.

            Para entendimento dos leitores, uma explicação se faz necessária. O médium, Frederico Jr., com quem se dá a seguinte a particularidade: Uma vez mergulhado no transe sonambúlico, ora e o seu próprio espírito, desprendido, que fala, descrevendo a cena que se desenrola nas regiões espirituais, ora são outros espíritos que se manifestam sucessivamente, entabulando-se, por vezes verdadeiros diálogos. '

            Foi neste estado que, aberta a sessão (29 de março) e feita a prece, começou ele:
           
            Meu Deus! Vejo um dos quadros mais belos que tenho visto na minha existência de médium. Preside o trabalho o Guia Ismael; a seu lado Paulo. O espaço em que flutua meu espírito é semelhante a um campo de flores odorosas; sobre ele... como calcular o número, se a minha vista não alcança a multidão toda? espíritos alados, numa mescla de virgens e de anjos. Ajuda-me, Bittencourt, a ver tudo ... - Vejo guias e guiados; almas que partiram antes dele esperavam-no, não para o banquete das lágrimas, porque a lágrima é um fruto da terra, mas para recebê-lo em hinos.

            Bittencourt - É o que tu estás vendo?

            Frederico - E os companheiros?

            Bittencourt - Espere um pouco.

            Frederico (Após uma pausa) - A multidão abre-se e lá no infinito - se meus olhos da alma alcançam o infinito... - vejo à frente Dias da Cruz e ele. Acompanham-no Romualdo, Bezerra, Sayão, Geminiano Lacerda, Silva, Netto, Santos, Isabel Sampaio, Gama... Mas onde iria eu?

            Ainda Frederico - Filgueiras, sim. Soubeste compreender bem a missão a que baixaste. Tu dizes 'não sou digno'. É nisso mesmo que consiste a tua grandeza. Estende como eu os olhos de teu espírito, que não foram velados pela morte, neste mesmo recinto onde tantas lágrimas enxugaste. Por isso, ontem dizia o nosso  Bittencourt: "Felizes daqueles que partem cobertos de bênçãos e saudades! Dias da Cruz, espírito eleito do Senhor, a ti também uma palma essa vitória.  Incansável como ele te mostraste sempre em favor dos enfermos, daqueles que o procuravam.

            Sim, Celina... "-Eu também vim - diz ela - por minha Mãe. Anjo do céu, pensamento, luz, sentimento, tudo de Maria... como és bom!" Comprimes ainda em teu angélico seio o cofrezinho dos vossos votos (3)."

            - Compreendo a alusão que fazes ao amor celeste. Aquele soube cumprir com o seu voto. Assim o saibamos nós, míseros cativos ainda da Terra!

            Celina - Sim, aqui mesmo onde soubeste plantar as flores mais odorantes da caridade, aqui mesmo, onde a dor foi sempre apaziguada com o carinho do teu espírito devotado ao bem, aqui onde o infortúnio achou sempre guarida, nesta tenda onde todo faminto encontrou o pão, todo sequioso uma gota d'água, aqui mesmo vieram receber-te os mais altos espíritos, abençoados pelo Senhor e a mais humilde das servas de Maria.     Sim, soubeste compreender tua missão na Terra, atravessando o teu cruciato de dores. Quando a contingência da matéria levava-te quase à cegueira (4), como que a lâmpada sagrada de teu espírito feria a pupila de teus olhos, e tua alma se irradiava, dando os seus derradeiros lampejos aqueles que precisavam do teu conforto, das inspirações que recebias, para abater o sofrimento. Não chores... É em nome de Maria que eu venho também saudar-te. Ela não pode estar estranha à apoteose que te prepararam neste dia da tua passagem. Anjos do céu, espíritas benditos, cantai hosanas! A terra fica o que a terra pertence. O espírito de luz se evola, retempera-se e vai por um pouco descansar das suas fadigas, para começar de novo. 'Repouse em paz' - diz a minha mãe - cobra novas forças e volta, mais forte ainda, a fazer da Doutrina de Meu Filho uma verdade no mundo que deixaste."

            Descansa por instantes, abençoado espírito, no aroma dessas flores da Caridade, do Amor, que tu mesmo plantaste, embalsama todo o teu ser espiritual, e quando o Pai Celestial de novo te chamar a nova jornada, que saibas, como desta vez, rasgando os pés, escondendo lágrimas, chegar até ao fim, abençoado e cheio de saudades.

            Frederico - Palavras de Bittencourt, ontem, e que este anjinho repete...

            Filgueiras (comovido até as lágrimas) - Eu não tenho o que dizer. Não fiz nada, não fiz nada...

            Bittencourt - Recebam as comunicações dos seus guias, rendam graças ao Senhor e encerrem o trabalho...

            (1) Grupo Ismael: Familiarmente conhecido por Grupo Sayão por ter sido por anos presidido por Antônio L. Sayão.         
            (2) Domingos Filgueiras era carioca, nascido em 1846, casado desde os 19 anos, pai de 4 filhos, abnegado médium receitista intermediário do espírito do Dr. Dias da Cruz e dedicado espírita. Por sua fé muitos se converteram, a saber: Manuel Quintão, Frederico Fígner, Abigail LIma. (por Zeus Wantuil, Grandes Espíritas do Brasil, Ed, FEB)
            (3) Alusão ao seguinte fato: Toda vez que um novo membro era admitido ao Grupo Ismael, o meigo e puro espírito Celina apresentava-se E recolhia em cofrezinho simbólico o voto pelo qual o iniciado se comprometia virtualmente a servir a causa de Jesus.

            (4) Filgueiras tinha descolamento da retina. Nos seus últimos anos ficara quase que totalmente cego.' (por Z. Wantuil, op. cit.)

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