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sexta-feira, 12 de maio de 2017

Mediunidade e Trabalho


Mediunidade e trabalho
Indalício Mendes
Reformador (FEB) Agosto 1956

A regularidade no exercício dos dons mediúnicos constitui pormenor de grande importância para o aperfeiçoamento do médium. Não basta a intermitência no trabalho de desenvolvimento, porque justamente o esforço metodizado é que produz resultados muito mais eficientes e seguros, não só porque disciplina o uso da mediunidade, fortalecendo as defesas que todo médium necessita aumentar, como porque lhe confere sensação de maior estabilidade em face das determinações doutrinárias.

Médium que não trabalha é como o lavrador negligente, que não se interessa pela cultura da terra que lhe foi entregue. Responde mais cedo ou mais tarde pelo abandono da tarefa, de um lado em virtude das alterações admissíveis do seu estado nervoso, e de outro lado porque, sensitivo como é, não pode esquivar-se ou eximir-se das influências que atrai, provenientes do plano invisível.

Se todos os indivíduos dotados de evidente capacidade mediúnica procurassem cultivá-la metodicamente, obedientes às normas da Doutrina codificada por Allan Kardec, muitos males poderiam ser evitados, em virtude de sua força latente encontrar meios e modos de ser utilizada aliviando sua sobrecarga nervosa sem malbaratá-la, antes aproveitando-a em benefício de outrem. São inúmeros os casos em que certos doentes de neuropatias não alcançam senão melhoras aparentes e passageiras quando, em vez de se entregarem ao desenvolvimento paulatino da mediunidade que possuem, preferem recursos que de modo algum poderão solucionar os problemas que defrontam. Exemplos há, e não poucos, de enfermos que, depois de tentativas demoradas e decepcionantes, resolveram, afinal, renunciar a preconceitos pueris e "experimentar" a "solução espírita". Admiram-se que tenham sido felizes, porque ignoravam que seus distúrbios nervosos se originavam da sobrecarga decorrente da "retenção de mediunidade", isto é, da falta de trabalho mediúnico. Ora, o médium é sempre um indivíduo de muita sensibilidade nervosa. É um sensitivo, por excelência. A evasão da sobrecarga nervosa, através do exercício da mediunidade, restabelece o equilíbrio indispensável à sua saúde. Como se vê, tudo é simples. Não há mistério nem necessidade de milagre. O médium tem a seu alcance a solução para muitas complexidades que se apresentam àqueles que têm olhos de ver e não vêem...

Acontece, no entanto, que, por sua própria rebeldia, não desejando privar-se da liberdade de gozar ilusórios prazeres da vida mundana, o médium às vezes recalcitra, preferindo dar de ombros aos seus deveres mediúnicos a perder as oportunidades com que lhe acenam as seduções do mundo. As obrigações espirituais não são incompatíveis com os prazeres sadios que a vida oferece. É preciso, no entanto, saber distinguir e separar o conveniente do inconveniente. Ao médium não se impõe a escravidão, mas se lhe sugere a compreensão. Nem outra coisa lhe é necessária para saber tomar o rumo certo. Desde que compreenda, satisfazendo as solicitações do bom-senso, de nada terá que arrepender-se, porque os encargos mediúnicos são tão imprescindíveis ao progresso espiritual quanto as obrigações que naturalmente assumimos em face dos nossos semelhantes e da sociedade a que pertencemos.

No capítulo de mediunidade e trabalho, devemos compreender que mediunidade é trabalho. A inação é incompatível com a finalidade do exercício mediúnico. Encontramos no querido livro da nossa crença - "O Evangelho segundo o Espiritismo" - a justificativa lógica da necessidade do trabalho: "Se Deus houvesse isentado do trabalho do corpo o homem, seus membros se teriam atrofiado; se o houvesse isentado do trabalho da inteligência, seu espírito teria permanecido na infância, no estado de instinto animal. Por isso é que lhe fez do trabalho uma necessidade e lhe disse: Procura e acharás, trabalha e produzirás. Desta maneira, serás filho das tuas obras, terás delas o mérito e serás recompensado de acordo com o que hajas feito.

"Não, os Espíritos não vêm isentar o homem da lei do trabalho; vêm unicamente mostrar-lhe a meta que lhe cumpre atingir e o caminho que a ela conduz, dizendo-lhe: Anda e chegarás. Toparás com pedras; olha e afasta-as tu mesmo. Nós te daremos a força necessária se a quiseres empregar.       

"Pedi a luz que vos clareie o caminho e ela vos será dada; pedi forças para resistirdes ao mal e as tereis; pedi a assistência dos bons Espíritos e eles virão acompanhar-vos e, como o anjo de Tobias, vos guiarão; pedi bons conselhos e eles não vos serão recusados; batei à nossa porta e ela se vos abrirá; mas, pedi sinceramente, com fé, confiança e fervor; apresentai-vos com humildade e não com arrogância, sem o que sereis abandonados às vossas próprias forças e as quedas que derdes serão o castigo do vosso orgulho.

Tal o sentido das palavras: buscai e achareis; batei e abrir-se-vos-á."

Tudo quanto aí está se entende também com médium e o seu trabalho mediúnico. É um como que "vade-mecum" que o auxiliará a desbravar o caminho e atingir a clareira da espiritualidade.

O Espiritismo é uma religião livre, mas justamente por ser livre e conceder a seus profitentes plena liberdade, respeitando-lhes o livre-arbítrio, é que deve contar sempre com a colaboração espontânea de cada um, subordinada aos princípios de sua Doutrina. Se sabemos todos que o homem está inelutavelmente sujeito à lei cármica, de causa e efeito, lei que rege os pensamentos e as ações de todos os espíritos, encarnados ou desencarnados, não se torna preciso o estabelecimento de normas rígidas, de dogmas férreos, de ameaças terríveis para a vida futura, nem de castigos tremendos e eternos.
Temos em outra lei, a da Reencarnação, a resposta simples e objetiva que a sabedoria do Pai oferece, a fim de demonstrar que as vidas sucessivas permitem o resgate dos débitos assumidos em cada existência terrena, acenando com a reabilitação progressiva até à conquista da remissão, através dos esforços continuados em prol de níveis evolutivos cada vez mais elevados. Isto prova que o Espiritismo é uma religião natural, lógica e simples, que respeita a Razão humana, acata a liberdade volitiva do homem, ensinando-lhe o rumo certo, mas não lhe impondo, antes sugerindo, a fim de não lhe cercear o livre-arbítrio, o caminho mais curto para alcançar a felicidade, anseio de todos os seres humanos.

A preparação mediúnica, pois, representa importante fator na conquista dessa felicidade. O médium, que não deve jamais ser encarado como que dotado de poderes sobrenaturais, pois o sobrenatural não existe no Espiritismo, pode cooperar bastante para a felicidade humana, buscando apurar sua mediunidade, dando exemplos cotidianos de exemplificação dos ensinamentos evangélico-doutrinários, desenvolvendo as qualidades que enaltecem a nossa espécie, mostrando-se útil, desinteressado e prestante, dando tudo de si e nada aceitando em paga dos benefícios que, por seu intermédio, descem do Alto. Aliás, para alegria do Espiritismo brasileiro, a imensa maioria dos trabalhadores da Seara Espírita, no setor abençoado da mediunidade, segue à risca a recomendação de Jesus: "Restituí a saúde aos doentes, ressuscitai os mortos, curai os leprosos, expulsai os demônios. Dai gratuitamente o que gratuitamente haveis recebido." (Mateus, X-8.) Os espíritas não negociam com orações, com preces, mantendo-se fiéis ao Evangelho do Mestre, que alertara os discípulos: "Precatai-vos dos escribas que se exibem a passear com longas túnicas, que gostam de ser saudados nas praças públicas e de ocupar os primeiros assentos nas sinagogas e os primeiros lugares nos festins, que, a pretexto de extensas preces, devoram as casas das viúvas. Essas pessoas receberão condenação mais rigorosa." (Lucas, XX, 45-47.)

Tomando como regra de conduta os ensinamentos evangélico-doutrinários, o médium cuidadoso e assíduo, estudioso e atento, será sempre iluminado pelas bênçãos dos Espíritos que, do outro aspecto da vida, conduzem os homens para seus grandes destinos espirituais.




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