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sexta-feira, 31 de julho de 2015

Doutrina Espírita

É de vital importância para o espírita o conhecimento real da Doutrina, base e fundamento da nossa crença. Ela possui todos os elementos necessários à orientação correta e segura dos profitentes do Espiritismo. Quanto mais se puder evitar as deturpações oriundas do Espiritismo. Quanto mais se puder evitar as deturpações oriundas de insuficiente conhecimento ou da assimilação dos princípios doutrinários, tanto melhor para os espíritas e para o Espiritismo. Precisamos compreender que a nossa crença não se destina ao cultivo de superstições e preconceitos, mas justamente ao esclarecimento da verdade, a fim de que todos possamos realizar uma vida simples e objetiva, que nos leve à exemplificação dos preceitos contidos no Evangelho segundo o Espiritismo. Devemos, pois, permanecer fiéis ao espírito de nossa Doutrina e prestigiá-la pelo estudo e pelo exemplo. Isto é bem mais importante de que se possa admitir à primeira vista. O espírito esclarecido não pode deixar de guiar-se pelo Evangelho e pela Doutrina, porque em ambos alcançará o verdadeiro rumo para a felicidade espiritual e a compreensão legítima dos deveres compatíveis com a vida terrestre.


            É na Doutrina que os espíritas encontrarão os melhores argumentos para o próprio esclarecimento e a iluminação daqueles que buscam a paz e a compreensão que o Espiritismo pode dar. Ela é um poderoso elemento disciplinador e possui grande poder para unificar, dando aos espíritas a indispensável solidez de opinião a cerca dos problemas fundamentais da vida e dos objetivos primaciais do Espiritismo. Aqueles que se uniram à Federação Espírita Brasileira, aceitando, consequentemente, a Doutrina codificada por Allan Kardec, formam elos de uma grande e forte corrente cristã, destinada à consumação dos propósitos contidos no Evangelho segundo o Espiritismo, obra santificada pelos princípios de Jesus, interpretados em espírito e verdade. Tão grande e benemérita é a finalidade do Espiritismo, que dele se pode dizer que é a luz que veio dar à Humanidade o verdadeiro sentido das palavras cristãs, porquanto é o Paracleto prometido pelo suave Nazareno. O Espiritismo não pertence a ninguém, não é de grupos humanos, pois provém do Alto, que é obra dos Espíritos, mensageiros do Cristo, que realizam, entre todas as dificuldades imagináveis, engendradas pela ignorância do homem, o trabalho cristão que  há de redimir as criaturas pela elucidação , pelo ensino, pelo exemplo. Recordemos  estas  palavras de  André Luiz: "O Espiritismo com Jesus é o edifício do aperfeiçoamento moral que os corações de boa vontade estão erigindo para o mundo."


*

            Pela Doutrina espírita, o homem aprende a compreender a vida e se exercita na tolerância esclarecida, Sabe que o aperfeiçoamento progressivo do espírito tem de ser fruto da autoeducação. Conhecendo o rumo traçado pela Doutrina, pode seguir nesse caminho a passos firmes, porque sabe para onde se dirige e o que o aguarda ao fim da jornada. Todavia, é mister conhecer e principalmente estudar a Doutrina. Ela tem de ser nossa preocupação constante porque, tal como a bússola, precisa de ser consultada a todos os momentos para que possamos retificar nossa rota, muitas vezes desviada sem que o percebamos. Uma vez assentada nossa diretriz, sob a luz do Evangelho segundo o Espiritismo, podemos estar certos de que, desde que não nos falte o testemunho indispensável da exemplificação cotidiana, no inclinaremos  para  Jesus, fiéis às diretrizes por ele traçadas para a Humanidade.


*

            Podemos saber tudo concernente ao Espiritismo. Desde que desconheçamos o Evangelho e a Doutrina Espírita, nada sabemos. O primordial e essencial é o estudo diário, a meditação frequente, a exemplificação permanente, para que possamos ter a consciência absolutamente tranquila quanto ao nossos deveres para com o Pai e o Cristo. Muitas obscuridades poderão desaparecer mediante a compreensão da Doutrina Espírita que está iluminada pelo Evangelho segundo o Espiritismo. Conheçamos as leis reguladoras da vida do espírito sob o fardo da matéria. Interpretemos devidamente a correlação da vida presente, terrena, com a vida futura, espiritual. Saibamos discernir com serenidade o papel que representamos na vida, perante os nossos semelhantes e, sobretudo, perante Deus e Jesus. Ser espirita apenas porque se aceita o fenomenismo psíquico, sem haver enriquecido o coração com as luzes do Evangelho e da Doutrina codificada pelo mestre Allan Kardec, é mera fantasia. Não é espírita quem não .realiza a exemplificação do Evangelho e da Doutrina. Essa exemplificação é  que define se somos realmente espíritas ou se apenas somos uns teóricos, de pena fácil e palavra solta, que arrancamos elogios dos que nos leem ou nos ouvem, mas não fazer colheita satisfatória, porque a semeadura, em tais condições, é ilusória.


            Estudar a Doutrina, explica-la com simplicidade e clareza, disseminá-la entre aqueles que dela necessitam e não sabem busca-la por si mesmos, é realizar plantio abençoado. Quem assim procede, pode aguardar serenamente a colheita, porque terá dado ao Espiritismo a garantia de uma boa safra. Quanto mais for a Doutrina  Espírita  estudada e compreendida, espalhada e assimilada, maia forte estará o Espiritismo. E é preciso que assim seja porque não sabemos o dia de amanhã. Precisamos ser previdentes e efetuar e efetuar o plantio  com escrupulosa atenção, para que o futuro não nos surpreenda desprevenidos.

Doutrina Espírita
Indalício Mendes

Reformador (FEB) Setembro 1955

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Motes da Vida - 2


"De amor, o exemplo da concha
É o mais belo que conheço,
Pondo na mão que a estraçalha
A pérola de alto preço."


Motes da Vida
Silva Lobato
por  Chico Xavier

Reformador (FEB) Julho 1970

quarta-feira, 29 de julho de 2015

O Essencial

             O  núcleo espírita é fundamental em nosso movimento.

            Por vezes nos confundimos, diante das solicitações ou necessidades do meio, e transferimos todo o nosso tempo, todos os recursos, toda a energia, para a concretização de grandes obras assistenciais, esquecendo-nos ou descurando da célula-mater da Doutrina.

            Um hospital é magnífico. O abrigo para criancinhas, louvável. A casa de velhinhos, admirável. O trabalho a benefício da gestante, notável.

            Tudo isso, porém, perde o seu significado doutrinário se não for, realmente, uma extensão do núcleo espírita, onde a Doutrina é estudada e onde sofremos um processo de reeducação de profundidade ainda não bem compreendida por nós.

            Desligar as tarefas doutrinárias das obras ou atividades assistenciais, a breve tempo nos coloca a copiar as instituições congêneres, não espíritas, centralizando nossos cuidados apenas sobre o organismo perecível ou oferecendo auxílio apenas para um efeito transitório, sem cuidar da sua causa.

            A premência de grandes verbas, para alimentar uma organização que se encontra além de nossos recursos, amiúde leva-nos a firmar convênios. Por muito respeitáveis que sejam, com o fluir do tempo tais eventos obrigam a desvincular a Doutrina Espírita do socorro ao assistido.

            Quem dá, sempre pede alguma coisa.

            Não raro, também, quem recebe se escraviza.

            Sem liberdade, voltamos a repetir os enganos iniciais da Casa do Caminho, onde os apóstolos de Jesus recebiam grandes parcelas de moeda do povo para manter a assistência fraternal, tornando-se tão subordinados a todos e tão ocupados com o complementar que olvidavam a propagação do próprio Evangelho.

            Há, também, o perigo da profissionalização.

            Uma casa de desobsessão, a exemplo, que deveria ser fundada com a participação de médico espírita, pode transformar-se num suntuoso hospital de psiquiatria. Aparecem, então, os facultativos profissionais, enfermeiros e funcionários que se regem pela legislação trabalhista e pelo nível salarial. Desaparece toda e qualquer atividade gratuita...

            O estranho, a partir de então, é o espírita. Ele se torna uma espécie de fantasma, a perambular pelos corredores do palácio de seu ideal. Termina sempre na sala de administração, com finalidade única de canalizar recursos financeiros para manter a organização vitalizada materialmente e, algumas vezes, lutando e chorando para conservar no frontispício do prédio a adjetivação de Casa Espírita.

            Uma vítima da precipitação!

            Todos os credos religiosos, até os materialistas, agem da mesma forma, seja em nome da caridade, seja no desdobrar de suas atividades profissionais, pura e simplesmente.

            O Espiritismo não é o fundador de tais movimentos.

            Enquanto isso, atividades específicas fenecem.

            O núcleo despovoa-se de seus cinco ou seis frequentadores habituais. A dona Maria, lavadeira de muitos anos, já não é agasalhada com o carinho fraterno, porque sua bolsa é minguada... e já não há tempo para essas coisas do passado religioso, ingênuo e místico!
           
            O socorro espiritual dilui-se, afogado por outras solicitações. A experiência de administrar por amor perturba-se frequentemente. O estudo e a transmissão dos princípios doutrinários passam a ser utópicos ou encargos de mera rotina.

            É preciso distinguir o principal do complementar.

            O núcleo espírita, obscuro, ignorado pela sociedade, que não faz passarela nas manchetes de jornais, algumas vezes perseguido ou mal compreendido, frequentado pelo “seu” Dito, pela dona Joana, pelo Neco e pelo Zé, é o centro de luz para o novo mundo.

            No desdobramento de suas atividades cristãs, no afã de corporificar o Evangelho, surgem, como acessório, as instalações apropriadas para as atividades assistenciais.

            A assistência é um compartimento do núcleo.

            Toda vez que a subversão se processar, fazendo com que o complemento assuma a posição do principal, cavamos um pouco mais o abismo que já existe entre movimento espírita e doutrina espírita, patrocinando um divórcio de dolorosas consequências.

            Vale, pois, refletir, vez por outra: - “O que estamos fazendo como movimento espírita é doutrina espírita; estamos ajustados ao objetivo, ao propósito, ao campo do Espiritismo?”

O Essencial
Roque Jacintho

Reformador (FEB) Agosto 1971




Mais com Jesus


Desarrazoado exigir de qualquer de nós transformações intempestivas.

* * *

            Por mais formosas e edificantes as lições de aperfeiçoamento moral, é forçoso acomodar-nos com o espírito de sequência, na marcha d tempo, a fim de que nos afaçamos a elas, adaptando-nos gradativamente aos princípios que nos preceituem. Ser-nos-á, porém, claramente possível melhorar-nos com mais urgência e segurança se adotarmos a prática de permanecer um tanto mais com Jesus, cada dia.

* * *

            Problemas intrincados surgiram, concitando-nos a soluções inadiáveis. Se estivermos-de sentimento interligado um pouco mais com o Cristo, aprenderemos a ceder de nós, sem qualquer empeço, apagando as questões que nos induzam à perturbação e à discórdia.

            Apareceram desacatos, impulsionando-nos ao revide.

            Se os recebemos, um tanto mais com Jesus, em nossas atitudes e respostas, todas as expressões de desapreço serão dissolvidas nas fontes da compreensão e da tolerância.

            Surpreendemos companheiros que se fazem difíceis.

            Se lhes acolhemos os obstáculos, conservando as nossas diretrizes e providências, um tanto mais com Jesus, para breve se nos transfiguram em colaboradores valiosos, convertendo-se, por fim, em estandartes vivos de nossas ideias.

            Encontramos desencantos nas trilhas da experiência.

             Aceitando-os, no entanto, um tanto mais com Jesus em nosso comportamento, para logo se transformam em lições e bênçãos que passamos a agradecer à Sabedoria da Vida.

* * *

            Em casa, no grupo de trabalho, na vida social, na profissão, no ideal ou na via pública, experimentemos sentir, pensar, falar e agir, um tanto mais com o Cristo, e observemos os resultados.

                                                                   * * *

            Pouco a pouco, perceberemos que o Senhor não nos pede prodígios de transformação imediata ou espetáculos de grandeza, e sim que nos apliquemos ao bem, de modo a caminhar com Ele, passo a passo, na edificação de nossa própria paz.

* * *

            Não te atemorizem programas de reajuste, corrigenda, sublimação ou burilamento.

            Ante as normas que nos indiquem elevação para a Vida Superior, recebamo-las respeitosamente, afeiçoando-nos a elas, e, seguindo adiante, na base do dever retamente executado e da consciência tranquila, pratiquemos a regra da ascensão espiritual segura e verdadeira: sempre um tanto menos com os nossos pontos de vista pessoais e, a cada dia que surja, sempre um tanto mais com Jesus.

Mais com Jesus
Emmanuel
por Chico Xavier

Reformador (FEB) Agosto 1971

A Vontade de Deus

             A quem supunha que o livre arbítrio do homem seja absoluto, incontrastável , e que, no uso dessa prerrogativa, ser-lhe-ia possível fazer ou deixar de fazer o que bem entendesse, até mesmo rejeitar os planos de Deus, ou colocar-se ostensivamente contra eles, sem que houvesse meio de dobrar-lhe a cerviz.

            A teologia tradicional assim o ensina e uma vasta literatura, dita cristã, também o confirma, ao apregoar que a vontade de Deus está sendo frustrada constantemente pelo homem aqui na Terra, como já o fora por grande número de anjos lá no céu.

            Puro engano.

            Deus quer que o homem tenha o mérito da glória para a qual o destinou e por isso, a par das revelações progressivas com que lhe há iluminado a consciência, concede-lhe relativa liberdade, a fim de que cada qual a alcance por si mesmo, pelo próprio esforço. Insipiente, pode ele, então, tal qual o filho pródigo da parábola evangélica, enveredar por ínvios carreiros (os erros e crimes de toda espécie), distanciando-se da retidão (o cumprimento das leis de Deus).

            Cada vez, porém, que isso acontece, sofre tropeços, quedas e acúleos que o fazem retornar ao bom caminho.

            Destarte, esses transviamentos temporários, com as agruras e lacerações que lhes são consequentes, constituem experiências que ele vai adquirindo para melhor conduzir-se no futuro e não mais fugir ao roteiro que lhe cumpre palmilhar.

            A única coisa, pois, que o homem pode escolher, a seu talante, lemos algures, é o modo de cumprir a vontade de Deus; apenas isso.

            Quem, como Jesus, haja conseguido harmonizar o seu querer pessoal com a vontade divina, cumpre-a com gozo, deleitosamente, como se estivesse a participar de um esplêndido banquete. Daí as suas palavras: "O meu manjar é cumprir a vontade d'Aquele que me enviou" (João, 4: 34).

            Os que, entretanto, em razão de seu atraso espiritual, ainda se mostram recalcitrantes, uma vez escoado o "prazo de espera" que as Leis Divinas concedem a todos para que se submetam espontaneamente ao seu império, terão que cumpri-las, quer o queiram quer não, ainda que com sofrimento, dolorosamente, porque acima do alvedrio humano vige um Determinismo Superior, a regular e a garantir a ordem universal.

            O equívoco dos que acreditam seja possível ao homem deixar de cumprir os desígnios de Deus reside na ideia corrente de que ele é "essencialmente mau", e pode querer manter-se eternamente afastado do Supremo Bem.

            Essa ideia, todavia, é falsa e insustentável.

            Filho de Deus, criado à "imagem e semelhança" d'Ele, o homem não é, nem poderia ser mau por natureza; pelo contrário, é "essencialmente bom", potencialmente idêntico ao Criador, e, pela evolução, dia virá - embora longínquo - em que se tornará uno com Ele.

            Esta conclusão, que pode escandalizar a muitos, nada tem de extraordinária. Um recém-nascido, malgrado sua fragilidade e inconsciência, é um ser adulto em potencial. O homem, semelhantemente, em que pese a suas limitações atuais, possui em germe todas as faculdades que hão de deificá-lo. Questão de tempo, trabalho e perseverança nos bons propósitos. Assim não fora, e o Cristo não teria feito esta exortação: "Sêde perfeitos, como perfeito é o vosso Pai Celestial".

            Há ainda um outro fator de suma importância que impede a cristalização do homem na rebeldia: o desejo de ser feliz.

            A felicidade é sua maior e mais profunda aspiração.

            Todo homem quer possuí-la, anseia tê-la por companheira inseparável de sua existência.

            Por outro lado, não há um só que possa ter o desejo mórbido de ser infeliz para sempre, renunciando em definitivo às delícias da bem-aventurança.

            Ora, como "ser feliz" é uma decorrência de "ser bom", tanto quanto "ser infeliz" o é de "ser mau", segue-se que o homem, por mais embrutecido e perverso que seja, há de, infalivelmente, cansar-se de sofrer, por descumprir as Leis Divinas, buscando, afinal, aquela felicidade verdadeira e indestrutível que consiste em fazer o bem, ou seja, em cumprir, com amor, a vontade do Pai Celestial.

A vontade de Deus
Rodolpho Calligaris

Reformador (FEB) Agosto 1971

sábado, 25 de julho de 2015

Se crês em Deus


              Se crês em Deus, por mais te ameacem os anúncios do pessimismo, com relação a prováveis calamidades futuras, conservarás, o coração tranquilo, na convicção de que a Sabedoria Divina sustenta e sustentará o equilíbrio da vida, acima de toda perturbação.

*

            Se crês em Deus, em lugar nenhum experimentarás solidão ou tristeza, porque te observarás em ligação constante com todo o Universo, reconhecendo que laços de amor e de esperança te identificam com todas as criaturas.

*

            Se crês em Deus, nunca te perderás no labirinto da revolta ou da desesperação, ante golpes e injúrias que se te projetem na estrada, porquanto interpretarás ofensores e delinquentes, na condição de infelizes, muito mais necessitados de bondade e proteção que de fel e censura.

*

            Se crês em Deus, jornadearás na Terra sem adversários, de vez que, por mais se multipliquem na senda aqueles que te agridam ou menosprezem, aceitarás inimigos e opositores, à conta de irmãos nossos, situados em diferentes pontos de vista.

*

            Se crês em Deus, jamais te faltarão confiança e trabalho, porque te erguerás, cada dia, na certeza de que dispões da bendita oportunidade de comunicação com os outros, desfrutando o privilégio incessante de auxiliar e abençoar, entender e servir.

*

            Se crês em Deus, caminharás sem aflição e sem medo, nas trilhas do mundo, por maiores surjam perigos e riscos a te obscurecerem a estrada, porquanto, ainda mesmo à frente da morte, perceberás que estás com Deus, tanto quanto Deus está sempre contigo, além de provações e sombras, limitações e mudanças, em plenitude de vida eterna. 

Se crês em Deus
Emmanuel
por Chico Xavier

Reformador (FEB) Maio 1970

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Carta de um morto

         Pede-me você notícias do cemitério nas comemorações de Finados. E como tenho em mãos a carta de um amigo, hoje na Espiritualidade, endereçada a outro amigo que ainda se encontra na Terra, a cerca do assunto, dou-lhe a conhecer, com permissão dele, a missiva que transcrevo, sem qualquer referência a nomes, para deixar-lhe a beleza livre das notas impessoais.

            Eis o texto em sua feição pura e simples:

            Meu caro, você não pode imaginar o que seja entregar à terra a carcaça hirta no dia dois de Novembro.

            Verdadeira tragédia paro o morto inexperiente.  

            Lembrar-se-á de que o enterro de meu velho corpo,  corroído pela doença, realizou-se ao crepúsculo, quando a necrópole enfeitada parecia uma casa em festa.

            Achava-me tristemente instalado no coche fúnebre, montando guarda aos meus restos, refletindo na miserabilidade da vida humana...

            Contemplando de longe minha mulher e meus filhos, que choravam discretamente num largo automóvel de aluguel, meditando naquele antigo apontamento de Salomão - "vaidade das vaidades, tudo é vaidade" -,  quando, à entrada do cemitério, fui desalojado de improviso.

            Da  multidão irrequieta dos vivos na carne, vinha a massa enorme dos vivos de outra natureza. Eram desencarnados às centenas, que me apalpavam curiosos, entre o sarcasmo e a  comiseração.

            Alguns me dirigiam indagações indiscretas, enquanto outros me deploravam a sorte.

            Com muita dificuldade, segui o ataúde que me transportava  o esqueleto imóvel e, em vão, tentei conchegar-me à esposa em lágrimas.

            Mal pude ouvir a prece que alguns amigos me consagravam, porque, de repente, a onda tumultuária me arrebatou ao círculo mais íntimo.

            Debalde procurei regressar à quadra humilde em que situaram a sombra do que eu fora no mundo... Os visitantes terrestres daquela mansão, pertencente aos supostos finados, traziam consigo imensa turba de almas sofredoras e revoltadas, perfeitamente jungidas a eles mesmos.

            Muitos desses Espíritos, agrilhoados aos nossos companheiros humanos, gritavam ao pé das tumbas contando os crimes ocultos que os haviam arremessado à vala escura da morte, outros traziam nas mãos documentos acusadores, clamando contra a insânia de parentes ou contra a venalidade de tribunais que lhes haviam alterado as disposições e desejos.

            Pais bradavam contra os filhos. Filhos protestavam contra os pais.

            Muitas almas, principalmente, aquelas cujos despojos se localizavam nos túmulos  de alto preço, penetravam a intimidade do sepulcro e, de lá, desferiam gemidos e soluços  aterradores, buscando inutilmente levantar os próprios ossos, no intuito de proclamar aos entes queridos verdade que o tímpano humano detesta ouvir.

            Muita gente desencarnada falava a cerca de títulos e depósitos financeiros perdidos nos bancos, de terras desaproveitadas, de casas esquecidas, de objetos de valor e obras de arte que lhe haviam escapado às mãos, agora vazias e sequiosas de posse material. 

            Mulheres desgrenhadas clamavam vingança, contra homens cruéis, e homens carrancudos e inquietos vociferavam contra mulheres insensatas e delinquentes.

            Talvez porque ainda trouxesse comigo o cheiro do corpo físico, muitos me tinham por vivo ainda na Terra, capaz de auxiliá-los na solução dos problemas que lhes escaldavam a mente, e despejam sobre mim alegações e queixas, libelos e testemunhos.

            Observei que os médicos, os padres e os juízes são as pessoas mais discutidas e criticadas aqui, em razão dos votos e promessas, socorros e testamentos, nos quais nem sempre corresponderam à expectativa dos trespassados.   

            Em muitas ocasiões, ouvi de amigos espíritas a afirmação de que há sempre muitos mortos obsidiando os vivos, mas, registrando biografias e narrações, escutando choro e pragas, tanto quando vendo o retrato real de muitos, creio hoje que há mais vivos flagelando os mortos, almejando-os aos desvarios e paixões da carne, pelo menosprezo com que lhes tratam a memória e pela hipocrisia com que lhes visitam as sepulturas.

            Tamanhos foram meus obstáculos, que não mais consegui rever os familiares naquelas horas solenes para a minha incerteza de recém vindo, e, somente quando os homens e as mulheres, quase todos protocolares e indiferentes, se retiraram, é que as almas terrivelmente atormentadas e infelizes esvaziaram o recinto, deixando na retaguarda tão somente nós outros, os libertos em dificuldade pacífica, e fazendo-me perceber que o tumulto no lar dos mortos era uma simples consequência da perturbação reinante no lar dos vivos.

            Apaziguando o ambiente, o cemitério pareceu-me um ninho claro e acolhedor, em que não faltavam braços amigos, respondendo-me as súplicas, e a cidade, em torno, figurava-se-me, então, vasta necrópole, povoada de mausoléus e de cruzes, nos quais os espíritos encarnados e desencarnados vivem o angustioso drama da morte moral, em pavorosos compromissos da sombra.

            Como se vê, enquanto a Humanidade não se habilitar para o respeito à vida eterna, é muito desagradável embarcar da Terra para o Além, no dia dedicado por ela ao culto dos mortos que lhe são simpáticos e antipáticos.

            Peça a Deus, desse modo, para que você não venha para cá, num dia dois de Novembro. Qualquer outra data pode ser útil e valiosa, desde que se desagarre daí, naturalmente, sem qualquer insulto à Lei. Rogue também ao Senhor que, se possível, possa você viajar ao nosso encontro, num dia nublado e chuvoso, porque, em se tratando de sua paz, quanto mais reduzido o séquito no enterro será melhor.

            E porque o documento não relaciona outros informes, por minha vez termino também aqui, sem qualquer comentário.

Carta de um Morto
Irmão X
por Chico Xavier

Reformador (FEB) Novembro 1955


Com Amor

            O amor possessivo, que caracteriza a fase evolutiva da maioria das criaturas matriculadas na escola terrena, tem uma de suas mais dolorosas manifestações no drama afetivo diante da partida daqueles que fizeram breve trânsito pelo orbe.

            Na realidade, diante de alguém que participou de nossa constelação familiar e é chamado de retorno à Pátria Espiritual, poderemos nutrir desalento e sensação de quase revolta, lamentando lhe a ausência.

            Quanto menos soubermos respeitar as suas necessidades individuais, quanto menor for o tirocínio religioso para compreender a finalidade de sua encarnação - mais ampliaremos a área do desajuste afetivo, alimentando dolorosas queixas, com as quais queremos exprimir nossa dor.

            A proporção, porém, que soerguermos nossa visão para os horizontes espirituais da Vida Maior mais respeitaremos os ausentes, sem nos enredarmos nas tramas do desequilíbrio emotivo.

            Não significa isto menos amor e sim menos possessão. Não significa isto simples resignação inconsciente às leis divinas e sim mais entendimento para os quadros evolutivos individuais, que nem sempre conseguimos abarcar.

            Quando, pois o amor se tomar mais afeto e menos sentimento de propriedade, saberemos interpretar a bênção do reencontro, nas pautas das leis da reencarnação, e aceitaremos a ausência dos familiares queridos com saudade, sem desespero, rejubilando-nos por saber cumprida uma das etapas de suas lutas redentoras.

            Mais amor e menos sentimento de posse revela o grau de espiritualização que houvermos alcançado.

            Acolhamos com sabedoria e serenidade a lição do túmulo vazio que Jesus nos legou em seu Evangelho de amor e aceitemos com fé, confiança, amplo descortínio que todo Espírito vem de Deus e realiza sua regeneração, vencendo etapas, coparticipando de nossas experiências na posição de familiar - parente querido - sem que venha a pertencer-nos.

            O que une as criaturas, os únicos laços indestrutíveis, na consolidação das famílias espirituais, são os do amor com respeito, esmaecendo em nós o instinto da posse.

            Menos escravizados aos conceitos materiais - saberemos que as almas que se amam estão vinculadas a Jesus e nada poderá separá-las, no fluir dos milênios, porque não se separa na Terra o que Deus ajuntou.

Com Amor
Roque Jacintho

Reformador (FEB) Novembro 1972



terça-feira, 21 de julho de 2015

Ofensa, injúria, pedrada...



"Ofensa, injúria, pedrada...
Esquece tudo de vez,
Que a vida repõe na estrada
O bem e o mal que se fez."


Hinário de ideias
Octávio Kelly por Chico Xavier

Reformador (FEB) Julho 1970

Conflitos Domésticos

            Não nos reportamos ao divórcio para te dizer que essa medida é impraticável.

            Existem problemas tão profundos, nas resoluções de caráter extremamente particular, que só o entendimento entre a criatura e o Criador, através da reflexão e da prece, consegue resolver.

            Todavia, se conflitos caseiros te atormentam a vida, faze o possível por salvar a nave doméstica de soçobro e perturbação.

            Talvez a companheira te haja desconsiderado ou ferido... Provável que o companheiro te haja imposto agravo ou desapreço. Tudo terá começado num pequeno gesto de intolerância. A migalha de amargura imitou a bola de neve, convertendo-se em muralha de fel. Antes, porém, que a réstia de sombra se transforme em nevoeiro, compadece-te e procura compreender o outro coração que se te associa no lar.

            Quem sabe que a intransigência, a infidelidade, a irritação ou a secura com que te defrontas serão frutos de tua própria frieza, menosprezo, violência ou ingratidão?

            Para e pensa.

            Medita na ternura e no apoio que esperas recolher em casa, a fim de que te não faltem forças na execução dos próprios deveres, no dia-a-dia. Perceberás que indulgência e bondade criam bondade e indulgência, onde surjam.

            Mudemos a nós mesmos para melhor e aqueles que nos compartilham a estrada não se deterão insensíveis.

            Planta de novo a alegria e o bem, para que obtenhas o bem e a alegria novamente.

            Dá e receberás.

            Ninguém se agrega com alguém nas tarefas de burilamento e de amor, sem motivos justos. E nós que aprendemos a salvar o trigo e a batata, os campos e as fontes, saibamos preservar a nossa união também. Nesse sentido, entretanto, não exijas dos outros a iniciativa para as realizações da harmonia e da segurança. Dá o primeiro passo e os outros se seguirão.



Conflitos domésticos
Emmanuel
por Chico Xavier

Reformador (FEB) Julho 1970

Humildade



            A humildade é virtude indispensável a quem pretenda ser cristão.

            Por isso, a todo momento deparamos, na literatura religiosa, especificamente na oriunda de fonte cristã, a exaltação de tal postulado ético.

            Tratando-se de qualidade indeclinável, importante é que se cuide em conceituá-la e, tanto quanto possível, concretizá-la a fim de que o modelo patenteie-se diante dos nossos olhos.

            Aqueles que se denominam cristãos têm procurado dar-lhe dimensão e forma.
Assim, decorrente de interpretações baseadas em diferentes pressupostos dos diversos ramos das religiões, que se desdobraram sob a égide do Cristo, a palavra humildade assume multiformes conotações, bem como é explicada por díspares conceitos.

            É  inclusive, vezes e vezes, confundida com atitudes exteriores e periféricas do comportamento humano. Por exemplo: aquele que injustamente é admoestado ou punido, por falta que não cometeu, e cabisbaixo aceita tal situação, sem esboçar mínimo gesto de defesa, é indicado como pessoa profundamente humilde.

            Aquele outro se veste, embora tendo recursos econômicos razoáveis, de forma displicente, e é apontado como humilde.

            Quem realiza determinado trabalho e, sendo este elogiado pelos observadores, se esquiva através de evasivas, afirmando que é incapaz, que foi mal feito, etc. (embora intimamente reconheça que está realmente bem feito), é revelado como humilde.

            Destarte, logicamente analisando tais atitudes, pela Filosofia Espírita, embasada pela ética Cristã, constatamos que tais distorções têm levado a humildade a confundir-se com servilismo, desleixo, exibicionismo disfarçado, etc.

            Compreendamos, porém, que humildade é alguma coisa mais profunda, mais intensa que os superficiais comportamentos acima descritos.

            A verdadeira humildade, de acordo com o Espiritismo, é a aceitação consciente e plena daquilo que somos. Com as virtudes e defeitos, com as possibilidades e limitações.

            Reconheçamos, portanto, que ela é a clara compreensão da imagem real do "Eu".

            O oposto da humildade é, por consequência, o orgulho.

            E este é, justamente, a imagem ampliada, destorcida, irreal que a pessoa faz do próprio Ego.

            O confronto das duas posições mentais gera conflitos, tensões, complexos, compulsões, que, muitas vezes, face ao desequilíbrio imposto ao psiquismo, abrem as portas à obsessão, subjugação e possessão por entidades desencarnadas.

            Portanto, a humildade será aquele estado mental, espiritual, alcançado pelo autoconhecimento, que propicia a visualização da própria imagem pela perspectiva da realidade. E isto permitirá a segurança, a tranquilidade, o otimismo e a fé no processo evolutivo a que todas as pessoas estamos submetidas.

            Eis a importância do efetivo estudo da Doutrina Espírita, que fornece subsídios ao conhecimento da vida e de nós mesmos, conhecimento que deveremos possuir para acelerar o processo de crescimento espiritual.

            Conclusivamente: ser humilde é reconhecer, serenamente, na vivência espiritual, o que somos, onde estamos e o que nos cumpre fazer e ser para avançar nos rumos da perfeição possível.
Humildade
Aylton Silva

Reformador (FEB) Julho 1970

Rumo Seguro

            Uma das razões que têm prevalecido para iludir o homem desprevenido, quando se trata do Cristianismo, hoje em sua lídima forma, sob a Doutrina Espírita fundada pelas nobres entidades do Além e codificada por Allan Kardec, é a pretensa passividade que deve caracterizar a criatura, tornando-a um ser apático, abúIico, incapaz de manifestações benéficas de energia, por sujeita a mórbido conformismo. Erro grave e crasso, que deve ser combatido pelo esclarecimento persistente, por exemplos expressivos que podem ser retirados do próprio Evangelho, onde Jesus não foi um vencido pela inércia nem pela covardia, mas um vencedor, porque sabia o que queria e justamente queria o que realizava. Supor-se que o espírita cristão deva ser um elemento sem vontade, relegado ao desprezo dos direitos mais sagrados, é não compreende verdadeiramente a essência da doutrina do Mestre. O conformismo doentio não é uma virtude. Todos nós temos o dever de lutar a boa luta pela defesa dos princípios sadios que norteiam a existência humana. Cruzar os braços, quando é preciso que eles movimentem com decisão não é trabalhar cristãmente mas demonstrar errônea compreensão da vontade divina, porquanto, na Natureza, tudo é vida, vibração, energia, luta pelo triunfo honesto e, sobretudo, reação contra o erro, que, em muitos casos, é o mal.
 
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            Quando, imolado na cruz, pediu ao Pai que perdoasse a seus algozes porque eles não sabiam o que estavam fazendo, essa atitude não foi, devidamente analisada, uma atitude passiva, mas de reação magnífica, não pelo ódio que expele vingança, mas pelo amor que recomenda perdão. Perdoar numa situação daquelas é revelar uma grandeza moral extraordinária, principalmente quando o perdão pode significar, como em tal caso, a dádiva derradeira de um coração pungido pela dor, acicatado pelo desencanto, torturado pela ingratidão mais cruel.

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            Se o mundo tem, ainda nos dias em que vivemos, tão errada compreensão do espírito do Cristianismo,  isso se deve a séculos e séculos de vida exonerada dos deveres verdadeiramente cristãos. A Humanidade levou largos períodos sob uma orientação que se distanciava imensamente do Cristo. Quando uma religião se impõe pelo terror ou pela força, seu espírito religioso já está morto. Desde que a doutrina do Mestre, toda amor, perdão e trabalho construtivo, foi substituída pelos excessos do poder político, extravasando-se das taças da amargura o fel do “crê ou morre”  já não era ela que se pregava, porque, na realidade, assim como o óleo não se mistura com a água, muito menos se podem irmanar o espírito do Cristianismo com as extravagâncias que se fizeram e se fazem ainda em nome do Cristo, embora representem integral subversão dos conceitos firmados pelo Mestre, há quase dois milênios, em sua peregrinação visível pela Terra.

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            O Espiritismo Cristão, corporificado nas lições memoráveis que Allan Kardec legou ao mundo, com a Codificação, é um aurorar glorioso para a criatura humana. Ele ensina o homem a vencer-se a si mesmo, antes de se lançar à grande tarefa de vencer o mundo. Sem estar senhor de si, não pode o homem desviar-se dos perigos que o ameaçam de todos os lados. O essencial é alcançar-se esse primeiro triunfo aprendendo a amar, a perdoar, a construir ou reconstruir, sempre imbuído de força de vontade, pronto às reações pelo bem e para o bem, sem despenhar-se no abismo da indulgência sem esclarecimento, que muitas vezes favorece a reincidência por não iluminar o culpado, encaminhando-o a destino em que ele possa compreender a diferença entre o bem e o mal certificando-se da verdade de que o mal não compensa jamais. O espírita tem de realizar, a todos os instantes, o trabalho da auto vigilância, da auto reforma, da autoeducação. E é tão difícil a tarefa, que muitos a ela renunciam ou se iludem, exaltando as belezas da doutrina do Mestre, pela palavra escrita e pela palavra falada, como se isto pudesse representar, no fim de contas, integração real nos princípios cristãos da Terceira Revelação. Nós mesmos, que redigimos  estas linhas não fugimos à compreensão de que não basta falar ou escrever, porque somente a exemplificação dá ideia precisa do valor moral do homem. Valemos, não apenas pelo que dizemos ou escrevemos, mas pelo que fazemos e pensamos. Eis porque sempre entendemos que os nossos escritos se destinam à orientação do nosso Espírito, porque nos sentimos mais do que qualquer outro confrade, necessitado do amparo espiritual que costuma vir em socorro dos que tem vontade e querem acertar o caminho.
           
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            Um das ideias que no acorreram ao cérebro, desde quando começamos a nos ocupar destes problemas foi a de que o espírita não pode nem deve ser um individuo desanimado. presa de invencível conformismo. É de seu dever reagir sempre contra os estados depressivos, não exagerando os fatos nem supondo que sempre as coisas se sucedem em razão de débitos espirituais do passado e do presente e que, por conseguinte, deve curvar a cabeça e quedar vencido até novo ensejo. Absolutamente. Temos as obrigações decorrentes do nosso estado cármico, vivemos subordinados à lei de causa e de efeito, mas tudo isso, em vez de nos sugerir desânimo e apático conformismo , deve-nos  lembrar a necessidade de vencer a nossa própria, reagindo salutarmente, dentro do Evangelho, pelo Evangelho e para o Evangelho. Se uma tempestade surpreende o pescador em alto mar, destruindo lhe o barco, ele deve lutar pela sobrevivência, agarrando-se a destroços da embarcação, nadando, fazendo, enfim, tudo quanto puder para salvar-se porque este é seu dever perante Deus. Se não o fizer, deixando-se tragar pelas ondas , sem haver sequer lutado pela salvação, convencido de que o naufrágio "estava escrito” e que não lhe cabia contrariar a vontade de Deus, estará consumando um ato de covardia. Na vida o homem jamais deve desistir da boa luta, da luta honesta, que dignifica o Espírito.

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            Supor que tudo quanto nos acontece é provação ou perseguição de maus Espíritos, quando nos orientamos evangelicamente, é cair num exagero que se aproxima do fanatismo. Devemos raciocinar, principalmente porque o Espiritismo é uma doutrina racional, onde a inteligência, a reflexão e o discernimento andam sempre juntos. Às vezes, algo nos sucede,  não porque estejamos resgatando débito ou porque Espíritos malévolos se empenhem em nos fazer mal, mas porque as circunstâncias se aglomeram e estabelecem situações que exigem de nós serenidade de exame, ponderação acurada e perfeito controle do pensamento, do atos e das palavras. Há provações e há também ocasiões em que, sob o influxo da lei cármica, podemos sofrer a ação de Espíritos mal esclarecidos ou trevosos. Mas não devemos aceitar que tudo seja sempre assim, do contrário pouco restaria para nos deixar fazer uso da inteligência e da razão. Devemos renunciar ao egoísmo, aos hábitos mentais perniciosos, às atitudes descaridosas. Renunciar, porém, à luta sadia, que enrijece o Espírito e o torna apto a melhor cumprir seus deveres perante Deus  e perante os homens, seria como que renunciar à própria vida que nos foi dada pelo Criador.

Rumo Seguro
Indalício Mendes

Reformador (FEB) Novembro 1955