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terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Mozart, Impressionável




Mozart,
 impressionável
José Monteiro Lima
Reformador (FEB) Jan 1946


            Collin de Plancy conta que certa vez estava Mozart mergulhado em profunda melancolia (melancolia que se lhe tornara habitual pela ideia do seu fim próximo); quando ouviu um carro parar à sua porta e alguém da sua casa lhe anunciar que um desconhecido desejava falar-lhe.

            "- Fui encarregado, disse-lhe o desconhecido, por importante personagem, de vos vir falar."  "- De quem se trata?"  interrompeu Mozart. - "- Não posso dizer-lhe - continuou o desconhecido - não deseja que se saiba."  " -Mas, que deseja ele?"  "- Acaba de perder uma pessoa que lhe é muito cara, cuja memória lhe será eterna, por isso deseja celebrar, todos os anos, sua morte com um serviço fúnebre, e vos manda pedir para compor um Réquiem para esse serviço."

            Mozart se sentiu tocado pelo tom grave das palavras do desconhecido e o aspecto misterioso do pedido ainda mais o impressionou. Mozart prometeu compor o Réquiem.

             " -Dispensai a esse trabalho todo o vosso talento. Trabalhais para alguém que conhece música."  " -Tanto melhor", respondeu Mozart.  "- Em quanto tempo estará pronto?"  " -Quatro semanas".  " - Muito bem! Voltarei no fim de quatro semanas. E o preço?"  "- Cem ducados".

            O desconhecido, depois de contar o dinheiro, colocou-o sobre a mesa, e desapareceu. Mozart ficou mergulhado por alguns momentos em profundas reflexões. Depois pediu uma pena, tinta e papel e, apesar dos conselhos da esposa, se pôs a escrever. Este ímpeto de trabalho durou vários dias. Trabalhava dia e noite, mas o seu corpo enfraquecido não podia resistir a tão grande esforço. Certo dia caiu desacordado.

            Como sua mulher procurasse distraí-lo dos pensamentos sombrios que o atormentavam, disse-lhe Mozart bruscamente:  "- Estou certo de que este Réquiem servirá para os meus funerais!" E não houve argumentos que pudessem afastá-lo desta triste ideia. Continuou, porém, a trabalhar, como Rafael no seu quadro da transfiguração, com a ideia fixa na sua morte próxima. Mozart sentia que as suas forças diminuíam cada dia mas o seu trabalho avançava. No fim das quatro semanas o desconhecido voltou a casa de Mozart, conforme tinha combinado.  "- Não me foi possível cumprir a minha palavra..."  "- Não se preocupe - disse-lhe o desconhecido. De quanto tempo necessitais ainda?"  "- Mais quatro semanas. O trabalho inspirou-me um interesse que eu não imaginava, aumentando-o muito mais do que eu queria."  "- Neste caso, disse-lhe o desconhecido, é justo que os seus honorários sejam aumentados. Eis aqui mais 50 ducados." "- Mas,disse-lhe Mozart cada vez mais admirado, quem sois vós?" " -Não vem ao caso. Voltarei no fim das quatro semanas."

            Saindo o desconhecido, Mozart mandou que um dos seus domésticos o seguisse a fim de saber onde ia ele, mas o criado voltou pouco depois sem encontrar o menor vestígio do desconhecido.

            Daí em diante se meteu na cabeça de Mozart de que o desconhecido não era um homem comum. Tinha a certeza, dizia, de que aquele homem estava em relações com o outro mundo, e vinha como aviso do seu fim próximo.

            Não trabalhou mais com ardor no seu Réquiem, mas, apesar de ter desfalecido várias vezes, o trabalho ficou finalmente pronto antes das quatro semanas.
           
            O desconhecido voltou no tempo marcado, mas Mozart já não existia... 






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