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sábado, 10 de novembro de 2012

A Memória Subconsciente




A memória
subconsciente

            Parece estar hoje definitivamente verificado pela ciência que existe no homem - além da memória consciente, fraca, imprecisa, caduca, que perde logo 90 % de suas aquisições e vicia o pouco que conserva - uma memória subconsciente infalível, minuciosa, eterna, que tudo conserva em todos os seus pormenores e para sempre.

            Parece-nos estar aceita como suficientemente provada a existência dessa onipotente memória subconsciente, porque ela se revela em casos especiais, como nos acidentes que põem a vítima em perigo de morte. Vê o homem, então, num rápido momento, o filme completo de toda a sua vida, de todos os seus pensamentos, desde os mais insignificantes, até os mais sérios, e o vê com todas as minúcias . Se o fato não estiver aceito por todos os cientistas, como nos parece, está pelo menos pelo Dr. Gustavo Geley, médico dos mais ilustres, que trata pormenorizadamente do assunto em seu livro "Do Inconsciente ao Consciente" e explica que os Espíritos que se comunicam mediunicamente não nos podem revelar isso, porque, ao entrarem em contato mediúnico conosco, sofrem limitações semelhantes às da reencarnação; o esquecimento de grande parte do passado e somente reconstituem a sua personalidade da mais recente encarnação, revi vem apenas a sua mais recente existência no mundo físico.

            Estendendo este conhecimento da existência dessa poderosa memória subconsciente às experiências do Coronel de Rochas e outros que demonstram a possibilidade de o sujet magnetizado reconstituir em todas as minúcias períodos de sua existência passada, inclusive de outras encarnações, vamos chegar à conclusão de que essa memória inconsciente é do Espírito e, como ele, eterna. Só existe o esquecimento para o cérebro, porém não e nunca para o Espírito. No entanto, essa preciosa e talvez tremenda faculdade do Espírito fica adormecida durante a encarnação e, em grande parte, durante as manifestações mediúnicas que forçam o Espírito a reconstituir somente sua mais recente encarnação e até a reviver seus preconceitos, como no caso de alguns adversários da reencarnação que, em suas comunicações, continuam pondo em dúvida essa verdade. Dizemos alguns, porque há outros que mudam completamente de opinião depois da morte e nos vêm ensinar a doutrina reencarnacionista, sobre a qual tinham dúvidas. Um destes exemplos é o de Sir Oliver Lodge que, em livros escritos em vida, apresenta dúvidas e, nas mensagens dadas depois da morte, pela mediunidade de uma Sra. que não aceita a doutrina palingenésica, ensina firmemente esse principio doutrinário.

            Essa poderosa memória subconsciente, que vai conosco pela eternidade em fora e se manifesta em forma de intuições, inclinações, pendores, vocação, como faculdades inatas no homem e só excepcionalmente, como nos casos de acidentes e de experiências magnéticas, se mostra em toda a sua força de pormenores analíticos, vem demonstrar, mesmo à luz da observação científica materialista, a doutrina reencarnacionista e resolver a sua maior dificuldade: o esquecimento completo das existências passadas.

            Demonstra que esse esquecimento existe mesmo dentro de uma encarnação; que esquecemos quase tudo que aprendemos, desde que o conhecimento se tenha transformado em faculdade e se torne desnecessário na memória, por já poder empregar-se inconscientemente, mecanicamente, como patrimônio do subconsciente. Formulemos alguns exemplos vulgares para melhor compreendermos essa transformação do conhecimento em faculdade. Ao aprendermos nossa língua materna, vamos conhecendo os vocábulos um a um, depois as frases que com eles formamos, mais tarde aprendemos a ler e vamos enriquecendo sempre esse vocabulário até que entramos a estudar gramática e conhecer as regras que regem a linguagem. Pois bem, em plena madureza, quando empregamos fluentemente a língua em nossos discursos, dispondo de milhares de vocábulos, não nos lembramos mais quando, como, onde, com quem aprendemos cada um desses vocábulos, cada uma das regras de gramática que já empregamos maquinalmente, sem reflexão alguma. Todo o longo trabalho de aprendizagem foi consciente, mas desceu para o subconsciente, ficado apagado da memória cerebral, desde que se tornou faculdade, e pode ser empregado inconscientemente. Posso refletir quanto queira, mas não me lembro quem me ensinou as palavras de que hoje me sirvo para falar e escrever em português.

            O mesmo exemplo se torna mais notável no caso de uma língua estrangeira que aprendemos mais tarde, com maior raciocínio. Aprendi inglês em livros, em fonógrafo, em cursos com diversos professores, lendo literatura inglesa, ouvindo discursos, sermões, programas de rádio, cinema falado. Hoje possuo um vocabulário suficiente para falar e escrever a língua em assuntos simples: tenho a anormalidade de pronunciar mal diversas palavras que aprendi só na leitura; mas absolutamente não me lembro como aprendi cada palavra, cada frase inglesa; por mais que me esforce, não consigo recordar o momento em que aprendi cada vocábulo nem cada regra de gramática inglesa; mas tenho certeza que aprendi, porque quando necessito falar ou escrever a língua possuo esse conhecimento, ainda que muito limitado e imperfeito. No entanto, eu me recordo bem que comecei a aprender inglês aos 18 anos, depois que sabia passavelmente o Esperanto; achava-me em pleno desenvolvimento físico, já sabia raciocinar sobre vários assuntos e exercia uma profissão. Pois, apesar de tudo isso, todo o processo de aprendizagem já desapareceu da minha memória.

            Limitamo-nos a citar exemplos pessoais, não por imodéstia, mas por falta de outros; porém sabemos de outros mais expressivos, como o do esquecimento total e absoluto de um idioma que se abandonou na infância. A criança que, por mudança de meio, deixa de empregar a língua que falava aos sete anos e só passa a empregar outra, em seu novo meio, esquece totalmente seu primeiro idioma que já falava correntemente.

            Se dentro da mesma encarnação, dispondo do mesmo cérebro, podemos esquecer totalmente de tudo que já nos não interessa e não interessa por já se haver transformado em faculdade, quão mais compreensível é o esquecimento dos fatos de outra encarnação, mais remotos e transformados em faculdades inatas?

            Enquanto aprendíamos a escrever à máquina, tínhamos que conservar a memória do lugar em que se achava cada tecla; éramos forçados a pensar mais nas teclas que no assunto da escrita. Com o hábito, o trabalho dos dedos passa a ser mecânico e já só pensamos na redação, porque os dedos cumprem automaticamente o seu dever, sem reflexão alguma. O esforço consciente dos primeiros tempos já desapareceu para o datilógrafo e deixou-lhe o pensamento livre para função mais importante, qual a de redigir seu trabalho.

            Possuímos essa memória maravilhosa que armazena tudo, absolutamente tudo, quanto já se tornou faculdade e, portanto, desnecessário à memória ordinária ou cerebral. Ela pertence ao Espírito e é seu céu ou seu inferno no estado de desencarnação, porque ele não pode fugir dela: todos os seus maus pensamentos lhe estão presentes e são julgados por ele mesmo com severidade, formando, assim, o seu tormento; ou todos os pensamentos bons constituem automaticamente sua felicidade.

            Além dos pensamentos maus que formam o inferno e dos bons que fazem o céu, há uma multidão imensa de pensamentos ociosos, banais, inúteis, formando essa memória subconsciente e eterna. A imensa maioria dos terrícolas não é muito má nem muito boa: é infantil, pensa e fala como crianças e deposita nesse infinito armazém toda sorte de puerilidades que representam perda de precioso tempo, de decênios vazios, de encarnações improdutivas. Na leitura de jornais, revistas, livros, no cinema, a imensa maioria do que depositamos em nosso subconsciente é material inútil, banal, fantástico que nos transforma a alma num armazém de quinquilharia inaproveitável. Mas isso ainda não é o mais horrível, embora seja um mal perdermos tanto tempo com pensamentos banais. O mais terrível é a quantidade de cenas apavorantes que lá depositam os crentes na existência do inferno, ao ouvirem a pregação ou lerem livros que descrevem a danação eterna dos maus.

            Quando a humanidade conhecer melhor essa memória subconsciente, fugiremos apavorados de tudo quanto nos possa inspirar pensamentos infelizes; cultivaremos o otimismo com o mesmo escrúpulo com que alimentamos o corpo. Toda a nossa literatura se transformará, todos os espetáculos serão rigorosamente otimistas. A Religião só falará do céu, nunca mais mencionará o inferno.

            Ensinando-nos como se forma o ser subconsciente, através dos pensamentos e sentimentos, a psicologia tem missão profundamente religiosa a cumprir no mundo. Esse ser subconsciente é a nossa própria personalidade real, o nosso "eu", e pode conquistar sua felicidade ou fazer sua desgraça por meio dos pensamentos que cultiva. Já há milênios vimos acumulando pensamentos inferiores ou banais em nossa memória subconsciente e assim formamos o homem velho, contra o qual temos que lutar. Os pensamentos e sentimentos armazenados no subconsciente formam automatismos do bem ou do mal, os impulsos que nos governam e nos fazem agir contra a nossa consciência. Paulo de Tarso, que se converteu ao Cristianismo depois de haver cultivado os mais terríveis pensamentos e sentimentos de fanáticos religiosos do Judaísmo, melhor do que ninguém soube dizer dessa luta entre o homem velho que domina o homem reformado. Em sua Epístola aos Romanos, cap. 7, vers. 18 a 21, diz:

                        "O querer o bem está comigo, mas o efetuá-lo não está. Pois não faço o bem que quero; mas o mal que não quero, esse pratico. Mas se eu faço aquilo que não quero, já não sou eu que faço, mas sim o pecado que em mim habita. Portanto, querendo eu fazer o bem, acho a lei de que está comigo o mal".
           
            Qual de nós não se poderia acusar, como Paulo, desse domínio tirânico do homem velho? Além desse domínio do subconsciente sobre o consciente, no Estudo do Espiritismo ainda verificamos outro aspecto não menos impressionante: é a natureza dos nossos pensamentos novos e velhos que forma nossa sociedade espiritual, atrai para nosso convívio Espíritos em afinidade com o nosso caráter, com a nossa personalidade espiritual. Além de nós mesmos nos obsidiarmos pelos pensamentos e sentimentos depositados em nosso subconsciente que nos tiraniza, ainda atraímos outros obsessores que não teriam poder algum sobre nós, se não encontrassem afinidade espiritual.

            Policiemos, pois, os nossos pensamentos e sentimentos, porque eles têm um poder tremendo para criar o mal ou o bem, nosso inferno ou nosso céu.

Cristiano Agarido / Ismael Gomes Braga
Reformador (FEB) Novembro 1947

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