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segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Porque sou Espírita?



Porque sou Espírita

            O padre do meu Quartel, bem fardado e ostentando as insígnias de capitão, iniciara um "fichário" de todo o pessoal, muito embora, de acordo com as nossas leis em vigor, nenhuma autoridade lhe coubesse para organizá-lo.

            Mas o "capelão" desejava saber de que se compunha o seu "rebanho" de fiéis católicos e ao qual deveria dedicar todo o zelo paternal, inclusive o de ouvir, cada uma das suas "ovelhas", em confissão - a grande arma secreta - e de ficar a par de tudo o que se passasse, inclusive com as consciências alheias.

            Ficou estupefato ao tomar conhecimento da existência de elevado número de adeptos da seita luterana, entre os soldados e, mais ainda, ao saber que existiam oficiais, sargentos e soldados que eram espíritas.

            Não me tendo sujeitado a ser "fichado" pelo ilustre capelão caí, naturalmente, no seu desagrado e foi com imenso prazer que, certa vez, alto e bom som, contei-lhe a minha história religiosa.

            Ei-la, em síntese:

            "Criado numa pequena cidade do interior do Ceará, cujo domínio religioso pertencia inteiramente aos clérigos, e subordinado ao preconceito de família, ainda criança, sem mesmo nada conhecer da maldade humana, fui levado ao confessionário, para contar... os meus pecados!

            Pecados de um menino de 7 anos!

            Plantara-se, destarte, o marco inicial de uma vida de misticismo, de pavor e de agonia, em que o receio de ir para o inferno, a cada instante, infundia tamanho medo, que concorria, cada vez mais, para tornar-me tímido e exageradamente temeroso.

            Felizmente, fui estudar na capital, conheci um meio mais adiantado, rompi as amarras que me prendiam às sacristias e joguei por terra os antolhos tão prejudiciais a um jovem da minha idade.

            Veio, depois disto, a fase da repulsa e da melhor compreensão.

            O paganismo da Igreja Católica embasbacara-me; as suas cerimônias litúrgicas, feitas para impressionarem o povo, desiludiram-me e fiquei descrente do catolicismo, como era de esperar.

            Não via o exemplo de humildade, tão preconizado pelos seus representantes, enquanto a exploração, por toda parte, constitui a o apanágio dos seus sacerdotes, que jamais deixavam de clamar por maiores "esmolas" e que recebiam "espórtulas" por tudo quanto faziam, exceto pela confissão, dado o interesse que ela representa para os "príncipes" da igreja.

            Era impossível continuar sendo católico, porque sempre combati o fingimento e, como homem, não devia ser hipócrita, enganando a mim mesmo.

            Nunca mais pisei numa igreja, a não ser ao tempo de solteiro, para olhar as pequenas, namorar ou cumprir um encontro marcado para a hora da missa domingueira, como faz muita gente por este Brasil afora.

            Li certa vez, que podemos abraçar o Espiritismo por duas maneiras: pelo estudo da doutrina ou forçado pelo sofrimento, que é o caso mais comum.

            Realmente, foi isto o que me aconteceu.

            O desaparecimento súbito do meu velho pai trouxe, em consequência, um profundo abatimento moral que me conduziu às raias do desespero.

            Seria possível continuar assim?

            Certamente não. Minhas responsabilidades, na vida material, eram enormes: deveres profissionais, manutenção da família e educação dos filhos, impunham-me outra atitude de energia e mais firmeza.

            Mas, como reagir contra tanta fraqueza?

            Ah! Para felicidade minha, tratei de fortalecer o espírito.            

            Lembrei-me de recorrer à doutrina dos seres invisíveis que povoam os mundos.

            Recebi, pelo correio, a coleção das obras de Kardec que, a pedido meu, enviara a Federação e, daí para cá, tenho estudado constantemente tudo quanto diz respeito ao Espiritismo, conquanto continue sendo um ignorante no assunto, dadas a sua transcendência, a sua pureza e a sublimidade dos seus ensinamentos.

            E porque sou um espírita?

            Porque vi no Espiritismo a verdadeira filosofia, o caminho seguro a trilhar neste mundo cheio de escolhos, a única religião despida de exteriorizações, dado que seu caráter científico permite perscrutar a verdade e demonstrar cabalmente a excelência da vida espiritual.

            Porque encontrei nele a verdadeira caridade, sem publicidades e sem ostentações, a socorrer os necessitados, os sofredores e os presidiários.

            Porque não há hipocrisia nem falsidade; não há preces a troco de dinheiro, nem ninguém visa, exclusivamente, os bens materiais; não há ódios nem vinganças; não há diferenças sociais, nem preconceitos de cor.

            Porque achei nele a luz confortadora, a grandeza dos corações generosos, a sinceridade nas atitudes e o encanto nas afirmações de fé.

            Porque não existem ameaças aos que creem, nem perseguições aos que se não subordinam aos seus princípios salutares.

            Porque não se engana a ninguém, não se mistifica nem se explora o Cristo; não se emol duram personagens, nem se lhes atribuem qualidades divinas.

            Porque passei a compreender melhor a vida, a ser tolerante, a sentir o conforto da moral pura, que não visa livrar ninguém das fúrias demoníacas mas, apenas, o aperfeiçoamento espiritual.

            Porque aprendi a ser paciente, a encarar de melhor forma os problemas da vida e a procurar, sempre, fazer algo em prol da humanidade, pelo amor fraternal e para o bem-estar da própria consciência.

            Porque comecei a entender a felicidade terrena sob outro prisma mais realístico, mais humano e mais sentimental".

*

            Padre! O Espiritismo não precisa tornar-se uma religião obrigatória ou semioficial. Os que a seguem, o fazem por compreensão e por livre e espontânea vontade. Esta é a mais pura verdade!

R. Alencar Nogueira
Reformador (FEB) Fev 1948


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