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domingo, 9 de setembro de 2012

56. "Doutrina e Prática do Espiritismo"





56   ***

            Numa documentada pesquisa feita em tal sentido, o consciencioso investigador Sr. Ernesto Bozzano coligiu, entre outros, os seguintes casos, que foram dados à publicidade na edição de março de 1906 da ANNALES DES SCIENCES PSYCHIQUES, de Paris, e mencionados por Léon Denis em sua obra LE PROBLEME DE L'ÊTRE ET DE LA DESTINÉE (1):

            (1) Cap. X, pág. 184 e segs.

            1º Caso - Na vida do Rev. Dwight L. Moody (estrênuo propagandista evangélico nos Estados Unidos) narrada por seu filho (págs. 485) há esta descrição de seus últimos momentos:

            "De repente o ouvimos murmurar: "a Terra se afasta, o céu se abre diante de mim; transpus o seu limite extremo... Não me chamem; tudo isto é belo: dir-se-ia uma visão extática. Se é isso a morte, como é doce!.. " O semblante se lhe reanimou, e com uma expressão de jubiloso enlevo, prosseguiu: Dwight! lrene! Vejo os meninos!" (Aludia a dois de seus netinhos, falecidos) Voltando-se em seguida para sua mulher, disse: "Sempre foste para mim uma boa companheira. "Proferidas estas palavras, perdeu os sentidos."

            2º Caso - Hudson Tuttle, o notável médium norte-americano, assim refere (THE ARCANA OF SPIRITUALlSM, pag. 167) um outro caso de que teve conhecimento:

            "Um episódio profundamente emocional se produziu, há alguns anos, na cidade de Hartford. O indivíduo que m'o referiu estava de tal modo convencido do cunho supranormal do que presenciara que o fato lhe ficou na memória. Reside atualmente ainda em um Estado do oeste e é um homem prático, positivo, incapaz de se deixar levar por devaneios.

            "No momento a que me refiro, velava ele à cabeceira de um tipógrafo, em estado moribundo. Havia cerca de meia hora, ia o agonizante se extinguindo pouco a pouco. A respiração, cada vez mais opressa, viera a se tornar muito lenta e difícil, até que o aludido assistente o julgou morto. Subitamente, abriu as pálpebras e, com expressão de grande surpresa no olhar, iluminado o rosto em um transporte de alegria, como se reconhecesse alguém, exclamou. "Tu, tu, minha mãe!" E caiu morto, sobre o travesseiro.
           
            "- Ninguém me poderá jamais convencer - diz o narrador desse episódio - de que aquele homem não tivesse realmente visto sua mãe."

            3º Caso. - A páginas 50 e 51 de sua obra SOME REMINISCENSES refere do seguinte modo o Sr. Alfredo Smedley os últimos momentos de sua mulher:

            "Pouco antes de morrer, os olhos se lhe fixaram nalguma coisa que os pareceu animar de uma intensa e agradabilíssima surpresa, - "Olha - disse ela - minha irmã Carlota! Minha mãe, meu pai, meu irmão João, minha irmã Maria! Agora me trazem também Bessy Heap. Estão todos aqui. Oh! Como é lindo! como é lindo! Não os estás vendo?" - Não, minha querida, lhe respondi, e o sinto muito. - "Então não os podes ver? - repetiu a doente, com surpresa. - Entretanto, estão todos aqui; vieram para me levar consigo. Uma parte de nossa família já atravessou o grande luar e brevemente estaremos todos reunidos na nova morada celeste." Devo acrescentar que Bessy Heap tinha sido uma criada fiel, muito dedicada a nossa família e sempre manifestara afeição particular à minha mulher.

            "Depois dessa visão extática, a doente ficou algum tempo como exausta; por último, dirigindo fixamente o olhar para o céu e levantando os braços, expirou."

            4º Caso. - O doutor Paulo Edward s escreveu, em abril de 1903, ao diretor da revista LIGHT, de Londres:

            "Em 1887, quando residia numa cidade da Califórnia, fui chamado para assistir aos últimos momentos de uma senhora de minha amizade, a quem eu muito estimava e que, em consequência de uma tísica pulmonar, se achava em tal extremidade. Sabiam todos que essa nobre e distinta senhora, essa mãe exemplar, estava irremediavelmente condenada a uma morte próxima. Ela acabou por também o saber e quis então preparar-se para o momento extremo.

            "Chamou os filhos para junto do leito e os abraçou um a um, em seguida ao que os despediu. Seu marido se aproximou em último lugar, a fim de permutarem o supremo adeus. Achou-a no pleno gozo de suas faculdades intelectuais.

            - "Newton (é o nome do marido) - começou ela por dizer - não chores, porque eu não sofro. Minha alma está preparada e serena. Amei-te aqui na Terra; continuarei ainda a te amar depois da minha partida. Tenciono vir ao pé de ti, se me for possível; não o podendo, velarei do céu por ti e por meus filhos até que venham reunir-se a mim. Agora, o meu mais vivo desejo é ir-me embora. Estou vendo muitas sombras que se movem em torno de nós, todas vestidas de branco. Ouço uma deliciosa melodia... " Oh Cá está a minha Sadie, perto de mim, e sabe perfeitamente quem sou eu! " (Sadie era uma filhinha que ela perdera havia dez anos). - "Sissy - lhe disse o marido - minha Sissy, não vês que estás sonhando?" - "Ah! meu querido, replicou a doente, porque me chamaste? Agora me custará mais o ir-me embora. Sentia-me tão feliz no além; era tão belo, tão delicioso! Após uns três minutos, acrescentou: "Novamente me vou e desta vez, não voltarei, ainda mesmo que me chames."              

            "Durou esta cena oito minutos. Via-se bem que a agonizante fruía visão perfeita e simultânea dos dois mundos, pois que falava das figuras do outro lado, que em torno dela se moviam, e dirigia ao mesmo tempo a palavra aos que aqui ainda se encontravam... Nunca me sucedeu assistir a um trespasse tão solene e impressivo. 

            5º Caso. - O doutor Wilson, de New York, que assistiu aos últimos momentos do tenor James Moore, assim os descreve:

            "Eram quatro horas, e a tênue luz da madrugada, que ansioso ele esperava, ia começando a se infiltrar pelas janelas... Procurei observa-lo e verifiquei que tinha o rosto calmo e o olhar límpido. O pobre enfermo olhou para mim e, apertando-me a mão entre as suas, disse: "O senhor tem sido um bom amigo para mim, doutor. Não me tem abandonado." Passou-se então um fato, que nunca mais esquecerei, por toda a vida, alguma coisa que a minha pena é incapaz de descrever.

            "Não me posso doutro modo exprimir senão dizendo que, ao mesmo tempo que o doente parecia conservar integra a razão, foi transportado para o Além, e embora me não seja possível explicar perfeitamente o fato, estou absolutamente convencido de que ele, o doente, penetrara na região espiritual. Elevando, com efeito, a voz, muito mais do que o pudera fazer durante a enfermidade, exclamou: "Cá está minha mãe! Vens me buscar, mamãe? Não, não; sou eu que irei para ao pé de ti. Espera um instante; mamãe; eu estou quase livre, posso ir me reunir a ti. Espera um momento." - Seu rosto adquirira uma expressão de felicidade inexprimível; o modo por que falava me causou uma impressão como nunca, até então, sentira. Ele viu sua mãe e lhe falou; disso estou tão firmemente convencido como de estar sentado aqui neste momento.

            A fim de bem fixar a lembrança do que constituiu o fato mais extraordinário a que jamais me fora dado assistir, registrei imediatamente, palavra por palavra, o que acabava então de ouvir. Foi a morte mais bela que já presenciei." (LIGHT, 1900, pág., 413).

            Essa presença de seres caros - amigos e parentes - desencarnados, em torno ao leito do moribundo, ou - o que será porventura mais exato - simplesmente perceptíveis à sua vista psíquica, embora à distância (1), que em tal caso cessa: de existir, é ao demais um fenômeno geralmente observado, constituindo mesmo um indício de próxima desencarnação. Quando, com efeito, um doente em estado grave começa a ver os seres do plano espiritual, não está longe - e numerosos fatos o comprovam a  sua completa libertação dos laços da matéria. E o que deixamos dito a propósito do amortecimento das sensações ao avizinhar-se a hora final, explica do mesmo modo essa visão, isto é: operando-se, com o progressivo esgotamento
do fluido vital, sem renovação equivalente, o desprendimento gradual do perispírito e cessando, em consequência desse fato, a obscurecedora constrição exercida pelos órgãos corporais, o sentido psíquico, a que serve de veículo àquele corpo etéreo, vai readquirindo o seu livre funcionamento e permitindo assim a percepção dos seres e coisas do invisível.
           
            (1) Recordaremos o que, de passagem, ficou dito num dos primeiros capítulos: que o espaço, como o tempo, tais pelo menos como os concebemos, são noções meramente relacionadas com o nosso estado de encarnados e, portanto, com a imperfeição dos nossos órgãos . Para o espírito, mesmo apenas meio desprendido, desaparece ou deve, pelo menos, se modificar consideravelmente essa noção.


            Em muitos casos, quando pela natureza da enfermidade o doente perde, com grande antecipação, a lucidez ou fica tolhido da palavra, a presença dos parentes e amigos desencarnados, que vêm receber "no limiar da eternidade " o espírito prestes a partir, tem sido atestada por mais de um vidente, do mesmo modo se tendo obtido idêntico testemunho em relação ao processo de desencarnação.

            Stainton Moses - um ilustre pastor protestante, convertido ao Espiritismo por múltiplas provas que obteve, graças às faculdades mediúnicas que se lhe desenvolveram e o levaram a essa conversão - assim descreve um fenômeno daquela ordem a que assistiu:

            "Tive recentemente, e pela primeira vez na vida, ocasião de estudar os processos de transição do espirito. Tanta coisa aprendi com essa experiência, que me agrada ser útil a outros, contando o que vi...

            Tratava-se de um parente próximo, de cerca de oitenta anos de idade, que caminhava para o túmulo, sem ser para ele atraído por alguma moléstia particular..." Eu percebera por certos sintomas, na aparência insignificantes, que o seu fim estava próximo, e corri a cumprir meu último dever."

            Graças aos meus sentidos espirituais, pude discernir que em torno de seu corpo e acima dele se reunia a aura nebulosa com o qual o espírito devia formar um corpo espiritual; e percebia que ele aumentava gradativamente de volume e densidade, posto que submetido a variações contínuas para mais ou menos, conforme as oscilações que se operavam na vitalidade do moribundo. Notei que algumas vezes um leve alimento tomado pelo doente ou uma influência magnética desprendida por uma pessoa que se lhe aproximava, tinha como resultado avivar momentaneamente o corpo, atraindo e como que empuxando o espirito. Esse aura parecia, pois, em fluxo e refluxo.

            Assisti a idêntico espetáculo durante doze dias e doze noites, e ainda que a partir do sétimo dia já tivesse o corpo dado sinais evidentes de sua dissolução eminente, essa maravilhosa flutuação da atividade espiritual, em marcha para a exteriorização, persistia sempre igual. A coloração da aura, pelo contrário, tinha mudado; além disso adquiria formas cada vez mais definidas a medida que se aproximava para o espírito a hora da libertação... Somente vinte e quatro horas antes da morte, quando o corpo jazia inerte com as mãos cruzadas no peito, o processo de desprendimento entrou a progredir sem recuo. No momento supremo, vi aparecer, em formas de espíritos protetores que se aproximaram do moribundo e, sem esforço algum, separaram o espírito desse corpo esgotado.

            Declarou-se ao mesmo tempo que o corpo estava morto. Bem podia ser que assim fosse: com efeito, o pulso e o coração não davam sinal de vida, e o espelho não se nublava com o hálito; entretanto, "os cordões magnéticos" ainda ligavam o espírito ao cadáver e aí permaneceram durante 38 horas. Eu creio que se, durante esse período, condições favoráveis se tivessem realizado, ou se uma vontade poderosa tivesse agido sobre o cadáver, ter-se-ia podido fazer o espírito voltar ao corpo. A ressurreição de Lázaro não se teria podido produzir nas mesmas circunstâncias?..

            Quando, finalmente, os cordões se romperam, as feições do defunto, nas quais se liam os sofrimentos padecidos, serenaram completamente e se impregnaram de inefável expressão de paz           e de repouso."            

            Os exemplos e testemunhos que aí ficam têm talvez a desvantagem de só se referirem a uma determinada classe de indivíduos, isto é, aos que se podem supor de uma condição moral relativamente elevada, para os quais a morte, por mais que os atemorizassem, quando na plenitude da vida e do vigor, pela ignorância em que estavam de sua verdadeira significação e benfazejas consequências, se despoja desse infundado aspecto terrorista, ao assomarem pela última vez, e definitivamente, ao pórtico solene do invisível.

            Mas é precisamente por ser esse, como o mais sugestivo, o caso que de preferência nos pode agora interessar, que limitamos a ele a exemplificação de que nos pareceu conveniente socorrer-nos, não sendo nosso intuito ocupar-nos, a propósito do fenômeno da desencarnação, das várias categorias de espíritos, cuja situação na outra vida fará objeto de estudo no capítulo seguinte.

            Mesmo, porém, para a média comum da humanidade, o que vale dizer, para a imensa multidão dos que nesta terra de exílio mourejam e penam pela obtenção de alguns elementos de progresso, a morte não é mais que "o derradeiro sono," o termo das lutas, padecimentos e vicissitudes, que tão angustiosa com frequência, tornam esta arriscada travessia . É, numa palavra, a grande libertadora dos aflitos, que o somos quase todos, "a única esperança que não falha," no dizer de um pensador, e mais que isso, o processo por excelência de transfiguração das criaturas.



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