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terça-feira, 28 de agosto de 2012

55a. "Doutrina e Prática do Espiritismo'



55a 


            Qualquer que seja a opinião que a crítica racionalista entenda formular a cerca desse fenômeno tão imperfeitamente definido e ainda menos satisfatoriamente Interpretado pelos mestres da ciência, ou se trate de sonhos contraditórios e vulgares, ou de sonhos lúcidos de cunho premonitório, ou ainda de visões simbólicas, como os que ficam relatados, não permanecerão eles menos como um testemunho vivo da atividade extra corpórea do espírito, durante a quotidiana fuga que uma lei providencial, não apenas permite, mas lhe impõe como uma necessidade, até certo ponto, neutralizadora de sua paralização nos limbos da matéria.

            Desse fato, por assim dizer, universalmente comprovado uma lição ou, pelo menos, uma advertência é lícito colher, e vem a ser que, se assim durante o sono do corpo goza o nosso espírito essa liberdade que lhe faculta entrar em relação com outros seres, como ele momentaneamente desprendidos, ou de todo livres dos grilhões carnais, devem ser tais momentos de temporária emancipação aproveitados, assim em frutuosos exercícios de instrução nas coisas desse plano espiritual em que coexistimos, como sobretudo na prática de uma salutar e benfazeja atividade; no primeiro caso, entrando em correspondência mental, senão em íntimo convívio, com elevados espíritos, cujos conselhos e lições devam ser postos em prática no estado de vigília, e no segundo caso buscando por nossa parte ir ao encontro de companheiros de presídio, isto é, de espíritos como nós encarnados, ou mesmo desencarnados, a fim de nos beneficiarmos com os testemunhos de uma afetuosa assistência que - tais sejam as condições em que nos coloquemos para o desempenho desse piedoso ministério - pode ser da mais fecunda e mútua utilidade.

            Por quiméricas que, aos olhos dos não iniciados, pareçam tais ideias, elas têm para os que das coisas espirituais se preocupam uma positiva significação.

            Se o destino do espírito, na Terra como em todos os planos do universo, é o eterno progredir, e se esse processo consiste no desenvolvimento das mais nobres faculdades, que em nós dormitam, e no exercício das virtudes de que a caridade é o coroamento magnifico, o dever nos corre de utilizar todas as oportunidades que para esse fim nos são proporcionadas.  

            Ora, o sono é um fenômeno de que unicamente o corpo, sujeito a perdas e cansaço, participa. O espírito, por natureza essencialmente ativo, não necessita repousar. Porque não há de, pois, utilmente empregar as mesmas horas de fugaz libertação, que lhe é quotidiana e providencialmente concedida?

            Assim procedem sempre, pelo menos, os iniciados nas transcendentes verdades com que o Espiritismo ilumina os seus adeptos, os quais sabem não dever abandonar ao repouso o fatigado invólucro e dele se desprender, sem resolutamente formar o propósito de prosseguir, no estado errático, a tarefa do bem que na vigília, os preocupa.

            Essa periódica e alternada permanência do homem na esfera espiritual - em diferentes graus, é certo, conforme a natureza de suas aspirações e sentimentos – sugere uma  outra consideração. Se assim constantemente visitamos a eterna estância donde viemos e para onde todos, mais dia menos dia, havemos de regressar definitivamente; se, por outros termos, o sono, que já a velha mitologia, no expressivo simbolismo de suas criações, apresentava como filho da Noite e irmão da Morte, é um ensaio de iniciação nesse mistério, que, não obstante, a todos amedronta, não a devêramos temer.

            Morrendo todos os dias- e que outra coisa é o sono senão morte transitória? - com serenidade confiante, que não com apavorada relutância, deveríamos aguardar o sono definitivo, que é também a definitiva libertação do nosso espírito.  

            E, todavia, o supersticioso temor que ao homem inspira a morte se explica por mais de um motivo: em primeiro lugar, o medo instintivo do desconhecido, alimentado pela ignorância das esplendidas realidades do Além, que o Espiritismo, com a sistematizada observação dos fatos,  veio positivamente demonstrar em nossos dias; em segundo lugar, e ainda em consequência dessa ignorância, que gera a incerteza da verdadeira vida, o instinto de conservação, em nome e a impulsos do qual se agarra obstinadamente o homem a única realidade em que geralmente crê; e por último o aparato lúgubre de que as religiões cercam a morte, fazendo-a aparecer, não o que realmente significa, isto é, o despedaçar da crisálida em que, borboleta imortal, se encerra o espírito, para o restituir à liberdade no infinito, mas como aniquilamento, por assim dizer, de tudo, a tal ponto que no Memento em vez de se lhe apresentar essa perspectiva sedutora de imortalidade, é a redução a nada o que se lhe recorda, advertindo-o de que “é pó e em pó se há de tornar."

            A essas razões, fundadas em errôneos preconceitos, condenados por isso a desaparecer, cumpre acrescentar uma última, que justifica, para a generalidade, o temor que inspira a morte: é a instintiva noção do que se pode considerar a prestação de contas, que mesmo - e sobretudo - o homem religioso sente que se verifica, nessa transposição, da esfera ilusória, em que vivemos, para o que a sabedoria popular com tanta justeza denomina o mundo da verdade.

            É porque, numa reveladora intuição, presente o homem que, com a passagem definitiva para o Além, caem os véus sob que na Terra todas as coisas se mascaram, e cada um lá se apresenta com a insofismável expressão do que realmente é e do que fez - tanto vale dizer que é o proferido no tribunal da consciência, e com todo o rigor desse foro inapelável, o julgamento da vida que deixou - que o homem, com justificado receio percebe avizinhar-se a hora solene dessa impressionadora transição.

            Vindo á Terra com o fim de pôr em prática elevados propósitos de reparação de erros do passado e aproveitamento nas virtudes, em que consiste aqui o seu progresso capital, quando reconhece próximo o termo da jornada e começam a ilumina-lo as primeiras claridades do outro lado, sente o espírito quão pouco se esforçara em tal sentido, e daí a legítima apreensão que o sobressalta.

            A não serem esses motivos de consciência, cuja pressão, todavia, desconhecem aqueles que levaram uma existência utilmente aproveitada no trabalho, no sofrimento e na pratica das boas obras, tríplice e inestimável patrimônio que de sua passagem pela Terra pode unicamente o espírito levar, o temor da morte é tanto menos justificável quanto essa passagem, ao contrário do que geralmente se acredita, não é em si mesma dolorosa. E o Espiritismo no-lo faz compreender, mediante fatos e argumentos.

            À medida que a enfermidade prossegue em sua marcha desorganizadora das funções vitais - para nos cingirmos ao caso mais comum - o progressivo esgotamento do fluido vital vai operando o desligamento do perispírito e afrouxando o laço que prende o espírito ao corpo, daí, resultando um amortecimento das sensações, por isso que ,tanto maior é a exteriorização da consciência, cuja sede, como se sabe, está no espirito, quão menos vivas são aí as repercussões do que se passa no organismo. Fora, portanto, dos casos de violenta desencarnação por acidente, em que o espírito experimenta um choque brusco, acompanhado de uma espécie de atordoamento, mais ou menos prolongado até que se inteire de sua verdadeira situação no novo estado, os fenômenos precursores da morte não são quase percebidos pelo agonizante.

            Para dizermos tudo em uma palavra, a morte, como seu irmão o sono - a não ser que se trate de consciências sobrecarregadas de remorsos, para as quais aproximação do julgamento constitui um motivo legítimo de angústia - é uma suave transição, podendo mesmo em alguns casos ser um momento de deslumbrantes êxtases, ante o esplendor das perspectivas descortinadas pelo agonizante, ao entrar na posse do sentido psíquico, em consequência da anulação, pelo menos parcial, do estorvo que lhe oponham  os sentidos corporais.

            É conhecida a exclamação de Goethe, ao expirar: Luz! Mais luz! Como não é menos expressiva a frase com que Schiller se despediu das trevas e das vicissitudes deste mundo: "Os olhos de meu espírito se abrem a uma luz mais viva!"

            Poderíamos citar, em apoio da nossa tese, numerosos testemunhos; mas acreditamos que, como subsídios ilustrativos e documentais, bastarão os poucos que passamos a reproduzir, em obediência ao duplo critério de os escolher entre os melhores e de não ocupar demasiado espaço. 



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