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terça-feira, 26 de junho de 2012

b.b A Moral do Espiritismo




 b/b  A Moral do Espiritismo



            No Espiritismo, a ideia dominante no ensino doutrinário de sua moral é a de progresso, de evolução moral humana. Já se disse que a moral não é nada se não for o elemento mais essencial e o mais indispensável do verdadeiro progresso da humanidade. (4)   É esse progresso moral, como fator principal do progresso espiritual, que o indivíduo deve ter em mira, sem que abandone o progresso em outros domínios, em outras direções, como o que lhe traz a cultura intelectual, o progresso, enfim, que lhe traz o conhecimento do verdadeiro e do belo. É um progresso geral que só pode ser feito gradualmente de encarnação em encarnação, neste e em outros mundos habitados mais evoluídos e na vida desencarnada, sempre se passando do inferior para o superior, até que se chegue, ainda com a aquisição de novas qualidades, desconhecidas e incompreensíveis para nós, à pureza, a uma perfeição, cujo limite não nos é dado conhecer, mas que não pode ser absoluta, porque perfeição absoluta só a tem Deus. Se o Cristo disse que procurássemos ser perfeitos como o Pai celeste é perfeito (Mt. V, 18) não foi porque fosse possível atingir a perfeição divina, o que seria igualar a Deus, mas para que mantivéssemos em nós o ideal de perfeição. Sendo o Cristo o ser mais perfeito que já veio à Terra, é justamente ele que deve servir de modelo e guia.

            (4) Alfred Loisy: La Morale Humaine, pág. III

            É com a aplicação do conhecimento de si mesmo e com o cumprimento de certos deveres, que esse progresso pode ser realizado.

            É pesquisa do conhecimento de si mesmo, é, de fato, o melhor meio do indivíduo fazer o progresso de suas qualidades morais. Para ter as regras de conduta moral, Sócrates fazia do conhecimento de si mesmo um método filosófico. É indispensável que o indivíduo se habitue a fazer, como disciplina, esse conhecimento, de tal modo que faça dele também um método para o estudo e desenvolvimento de seu Eu moral, como ele é em psicologia, estribado na reflexão e observação interior ou introspecção, um método para o estudo dos estados de consciência.

            É nesse conhecimento que pode estar baseada a autoeducação que o indivíduo deve procurar fazer. É no estudo moral interior, que o indivíduo deve fundar sua autoeducação, que concorrerá para o seu aperfeiçoamento moral, desde que seja feito com esmero e esforço constante. "Para uma autoeducação esmerada, diz num livro excelente, um Espírito instrutor, é preciso permanente exame de consciência, a fim de conhecer-se sempre, a todo o momento, o estado da própria alma. Deste modo, resolvido a aperfeiçoar-se, o indivíduo não perde ocasião de estimular o desenvolvimento das virtudes nascentes em si mesmo, e de afogar os vícios e maus hábítos." (5)
            (5)  Angel Aguarod: Grandes e Pequenos Problemas, pág. 266.

            Esse aperfeiçoamento moral é mesmo um dever para o Espírito encarnado. É o que lhe pode dar o verdadeiro sentimento de dignidade humana, ou o respeito de si mesmo. É um dever do indivíduo para consigo mesmo.

            De maneira que a moral espírita, como a moral do Cristo, está toda na exaltação da alma. Isto sem querer dizer, entretanto, que tudo na vida material seja sem valor. O corpo deve merecer um cuidado especial, sendo mesmo um dever do indivíduo o da sua conservação, com as preocupações de saúde e higiene e interdição do suicídio, visto ser ele o instrumento da alma, visto ter ele relações com a alma que é preciso manter em equilíbrio. O suicídio, sendo a morte voluntária, determinada pela falta de coragem do indivíduo na aceitação das coisas de seu destino, tem, segundo o Espiritismo, consequências dolorosas na vida futura.

            Mas há, acima de tudo, dois grandes deveres para o indivíduo, que são os dois maiores mandamentos, como disse o Cristo ao fariseu, doutor da lei, que o interrogou: o de amar a Deus e o de amar o próximo como a si mesmo (Mt. XXII, 35-39; Mc. XII, 28-31; Lc. X, 25-21).

            É, na verdade, um grande dever para o indivíduo o de procurar despertar na sua consciência a intuição que ele tem da existência de Deus e amá-lo na sua obra e na sua lei. Para o amar verdadeiramente, o indivíduo deve procurar cumprir sua lei com todo o interesse, com todo o rigor, isto é, deve preocupar-se sinceramente com o seu progresso moral. Nisto, está realmente o amor a Deus, além da adoração e veneração que ele lhe deve. Assim, nada ou pouco adianta a adoração a Deus, à maneira das religiões, exclusivamente com a fé, se o indivíduo não cogitar de pôr em prática sua lei moral, de aumentar seus valores morais.

            No dever de amar ao próximo, está, por assim dizer, enfeixado um conjunto de virtudes que o indivíduo deve procurar possuir para o preencher. A caridade é a expressão mais perfeita desse amor, não somente a caridade material, aquela que consiste em dar aos pobres aquilo que lhes falta, como a caridade moral e sobretudo esta, mostrando-se o indivíduo disposto a ser tolerante e indulgente com os defeitos de seus semelhantes, mesmo de seus inimigos, a perdoar-lhes as faltas, em vez de encolerizar-se, a não julgá-los, a ser afetuoso, benevolente e paciente nas suas relações com eles, na vida doméstica, cotidiana ou social, a fazer-lhes, enfim, todo o bem possível, de modo que, tudo resumido, importe na existência da humildade e ausência de orgulho e egoísmo, que são os dois defeitos mais graves do homem. A caridade pode ir até o sacrifício, a renúncia. Fora da caridade não há salvação, eis a divisa do Espiritismo moral. Na caridade, estão contidos os princípios de fraternidade e solidariedade, que devem existir entre todos os homens. Mas se todas essas qualidades devem subsistir nas relações dos homens entre si, claro está que eles deverão acatar os direitos uns dos outros. Nisso está o dever de justiça, que fica ao lado da caridade, baseado não só no respeito mútuo, como na identidade de natureza e fim.

            Por outro lado, se é um dever para o indivíduo fazer seu aperfeiçoamento moral, como afirmação ou imperativo categórico de uma lei moral, que é a lei ensinada pelo Cristo, se ele tem a liberdade de praticar todos os atos necessários para esse fim, tem também a de não praticá-los, ou praticá-los de modo que se contraponham a esse fim. Pela sua própria vontade, pode fazer o bem ou fazer o mal. Sendo o indivíduo livre, assim como pode cumprir essa lei moral, também
pode violá-la, tornando-se nesse caso responsável pela violação. Há, portanto, uma liberdade dentro da qual o indivíduo pode mover-se, liberdade tanto mais limitada quanto mais inferior espiritualmente ou moralmente for ele, e que se vai alargando à medida que vai evoluindo moralmente ou espiritualmente. Há, assim, apenas uma liberdade moral. A liberdade e a responsabilidade são, destarte, para o indivíduo noções correIativas.  

            Estando a lei moral sujeita livremente à observação ou violação, é preciso ver qual é o sistema de sanções que ela acarreta. No Espiritismo, elas são de ordem espiritual puramente, sem que, todavia, ele se, oponha às sanções de ordem material, as que aparecem por intermédio das leis penais, contanto que não afetem a conservação pessoal, como, por exemplo, a pena de morte e sejam mais educativas que punitivas. São a sanção chamada natural pelos moralistas e a da vida futura.  São sanções que existem, não para que a lei moral seja cumprida, mas porque ela não foi cumprida, ou foi violada.

            Na sanção natural, resultante dos atos praticados conforme a lei moral, surgem no indivíduo as consequências felizes ou infelizes. Os atos bons trazem necessariamente a felicidade, mais tarde ou mais cedo, como os maus a infelicidade. O indivíduo, que é justo com seus semelhantes, tem sempre o melhor meio de obter a justiça para si mesmo. Quando não há para o indivíduo a recompensa imediata, há pelo menos a de sentir-se mais digno, há como que um "crescimento do ser".

            Na sanção natural, está inserida a sanção da consciência. A consciência tem sido tomada por um juiz infalível, que "recompensa com as alegrias do dever cumprido ou pune com as torturas do remorso", tanto na vida corporal como na. vida espiritual.

            Na vida futura ou espiritual, é onde aparecem as verdadeiras sanções decorrentes da lei moral. Aparecem na sua plenitude e na maior intensidade. O Espírito, pela sua natureza fluídica, apresenta-se na vida espiritual com suas sensações, percepções e faculdades mais intensas, mais agudas, assim como com seus sentimentos mais fortes, de modo que tanto o bem como o mal, tanto as penas, que trazem o sofrimento, como as recompensas, que trazem a felicidade, são mais vivas.

            O sistema de sanções da vida futura no Espiritismo é um passo a mais dado sobre o sistema de sanções que foi pregado pelo Cristo, como este foi além do que pregou a lei mosaica. No Espiritismo, as sanções espirituais são, sobretudo, baseadas em observações mediúnicas. São os próprios seres saídos da Terra que vêm relatar as situações em que se encontram na vida espiritual, quando violam ou seguem os preceitos morais, descrevendo suas posições felizes ou infelizes. É preciso ler o Céu e o Inferno, de Allan Kardec, (6) para se notar a triste e dolorosa situação dos Espíritos culposos que povoam o espaço, ou já ter assistido às sessões espíritas de beneficência, onde se procura dar alívio e consolo a esses Espíritos, para se ver como eles aparecem com os sofrimentos, às vezes, os mais pungentes

            (6)  Allan Kardec: Le Ciel et L'Enfer ou Justice divine selon le Spiritisme, Paris, 1865.

            No código penal da vida futura, que foi publicado no Céu e o Inferno, Allan Kardec define não só as sanções espirituais provenientes dos males feitos na Terra pelos seres que se tornam depois Espíritos sofredores, inclusive as sanções expiatórias, como as daqueles que praticaram o bem e que se tornam Espíritos felizes, que merecem as recompensas. Deste modo, as sanções são sempre proporcionadas ao grau de mérito ou demérito do indivíduo.

            Assim como na moral espírita tudo se resolve na lei do amor, nas sanções tudo se resolve em reações às violações dessa lei. Mas como o desconhecimento dessa lei ou suas violações são imperfeições do indivíduo, as sanções não são senão reações a essas imperfeições. Por isso, Allan Kardec, depois de ter estudado detalhadamente todas as sanções da vida futura, mostrando que seus elementos principais estão no arrependimento, expiação e reparação, resume essas sanções na questão das imperfeições individuais ou falta de progresso moral, em três regras principais: 1ª - "O sofrimento está ligado à imperfeição moral"; 2ª - "Toda imperfeição, toda falta que decorre dela, contém em si seu próprio castigo, por suas consequências naturais e inevitáveis, sem que seja preciso uma condenação especial, para cada falta e cada indivíduo"; 3ª - "Todos podem desfazer-se de suas imperfeições pela vontade, podem afastar os males, que são consequência dessa imperfeição e assegurar assim na felicidade futura". (7)

            (7) Allan Kardec: Le Ciel et I'Enfer, pág. 109.


por   Chrysanto de Brito
in ‘Allan Kardec e o Espiritismo’
Ed. ECO – ano ?


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