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domingo, 6 de maio de 2012

Meios e Fins



Meios e Fins
           
            A criatura surge no cosmo com a predestinação de gravitar rumo ao foco da Onipotência. Escapa totalmente à percepção imaginar sequer o que seja e como se desenrola essa trajetória através da noite dos tempos, para usar a linguagem rica e simbólica das Escrituras. O que o homem pode vagamente perceber, ajudado pelas luzes do Consolador, é que, quando envereda pelas tortuosidades da encarnação, a caminhada se alonga quase infindavelmente e se entranha de peripécias cuja aspereza dilacera na proporção em que se desvaira nos desacertos do livre arbítrio, que o conduzem aos paroxismos da impenitência, do orgulho e do niilismo.

            Nessa alternativa, mergulha nos carreiros da forma adensada, onde passa a sofrer as injunções da lei de ação e reação e a ter de manejar instrumentos de materialidade grosseira, no esforço penoso e inelutável de reajustar-se às harmonias de que se apartou. Eis, num golpe de vista, a posição da humanidade que habita este planeta sublunar, às voltas com os trambolhos engendrados por sua própria insensatez, o que, ainda de quebra, num gesto de extrema soberbia e ignorância, ela prefere atribuir aos meneios de um acaso cego e caprichoso ...

            Indubitavelmente, a luta maior e ingente do homem é vencer as inibições e fobias que ele mesmo forjou e alimenta com muito fervor, e com as quais se diverte macabramente: a negar e a tentar destruir a própria essência de eternidade. É assim que, por muito que com isso se apoquentem os negativistas, desde os mais remotos registros da história da humanidade se denota a atração incoercível que sobre ela exercem os arcanos da religiosidade, que a faz estar sempre desconfiada de que existe alguma coisa além da morte. Nesse anseio, o homem se desencasula igualmente através de um processo lento, sofrido e progressivo, ao longo do qual navega desde as formas estapafúrdias do mais primitivo fetichismo até as expressões mais alcandoradas da fé abstrata, como soem ser as que nos oferece a Doutrina Espírita.

            É com razão, pois, que os espíritas se ufanam em sublinhar que o Espiritismo é uma doutrina que supera os condicionamentos em que ainda se demoram os credos que o antecederam na cronologia terrena e, por isso, abre mão dos recursos que lhes são ainda parte integrante e indispensável de suas manifestações, tais como símbolos, amuletos, ritos, paramentos, escapulários, incenso, liturgia, dogmas, sacramentos, templos, sacerdócio hierarquicamente organizado e quejandos. .. São meios que não se compadecem com os fins espiritualizados e espiritualizantes da Doutrina. Contudo, parece que seus profitentes não estão tão certos assim quando se trata das práticas a empregar em atividades que são complementos valiosos, mas que, dadas as contingências da materialidade em que estão mergulhados, costumam confundir os critérios de valorização e de prioridades, o que leva, com muita frequência, e parece que despercebidamente, à adoção de meios que não se compatibilizam com os alvos altanados do Espiritismo.

            Tal apontamento se ajusta primacialmente às iniciativas de cunho assistencial mantidas pelas instituições espíritas; no afã de realizar o que reputam um dever, não vacilam em se valer de meios que, sem dúvida, proporcionam os elementos de que necessitam, mas que, bem pesados, são antinômicos aos princípios e postulados da Doutrina. A questão é, realmente, grave e séria.  A bússola do espírita, porém, não é difícil de ser encontrada, nem está fora de seu alcance. Basta ter como assentado que, em Espiritismo, os fins não justificam os meios...


Editorial do Reformador (FEB)  em julho 1974



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