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sexta-feira, 29 de julho de 2011

Gabriel Dellane escreve sobre Allan Kardec


‘À Memória de Allan Kardec’

Por  Gabriel Delanne
Reformador (FEB) Agosto 1977

(Este artigo, traduzido de “Revue Spirite”, de 1º de Janeiro de 1907, pp. 50/58, com o qual a mais antiga revista espírita do mundo – lançada, em Paris, pelo Codificador – iniciava o 50º ano de fundação, foi escrito a pedido da redação, então sob a responsabilidade de Léopold Dauvil, Redator Chefe. Paul Leymarie (filho do casal Marina e Pierre-Gaetan) era o Diretor Gerente.)




                        Aceito, meu caro amigo, e com bastante prazer, a incumbência de homenagear o grande pensador que fundou a “Revue Spirite”, e cujos livros, escritos com método e clareza, levaram ao Espiritismo milhões de adeptos do mundo inteiro. Jamais seremos suficientemente reconhecidos ao valoroso espírito cujos trabalhos têm esclarecido, consolado e fortificado tantos corações amargurados pelas provações da vida.

            Constituirá, para ele, motivo de alegria ver a sua obra prosperar e aumentar em proporções tão vastas. Existia na Europa, em 1858, apenas duas revistas espíritas. Contam-se em nossos dias mais de cinquenta revistas que levam ao longe a boa nova da imortalidade, e sentimo-nos orgulhosos porque fomos os iniciadores do estudo dos fatos espíritas neste mundo cético, que tão desdenhosamente se mostrou para com a jovem ciência, desde o seu aparecimento.

            Foi-se o tempo em que a Ciência era apanágio de alguns privilegiados, democratizou-se ela, de maneira que cada um pode fazer hoje obra de sábio, empregando judiciosamente os seus métodos. Multiplicaram-se as pesquisas acerca do Espiritismo, a tal ponto que é preciso ser profundamente indiferente para não conhecê-las ; e não se diga sejam, somente individualidades isoladas que se ocupam desse assunto, mas igualmente numerosos agrupamentos, sendo que alguns deles se constituíram em verdadeiras academias criadas à revelia dos círculos oficiais.

            A fundação, na Inglaterra, da Sociedade de Pesquisas Psíquicas, e a do Instituto Geral de Psicologia, na França, são provas evidentes de nossa ação sobre as inteligências que meditam, pois quem sistematicamente não fecha os olhos diante da evidência entrevê logo a enorme importância das pesquisas que abrem, à Ciência e às aspirações da Humanidade, horizontes cujas profundezas mal podemos divisar.

            Substituir a fé cega em uma vida futura, pela certeza inabalável, resultante de verificações científicas, eis o inestimável serviço prestado por Allan Kardec à Humanidade. Introduzir a luz da observação e mesmo da experimentação, em domínio até então reservado às obscuras e intermináveis discussões literárias, era fazer obra de mestre, era quebrar as velhas molas do pensamento, injetar sangue novo no antigo espiritualismo, renovar a psicologia, indicando-lhe outro caminho mais fecundo, e preparar a mais rica colheita de novos conhecimentos de que se tem notícia nesses dois mil anos.

            Semelhante revolução intelectual provoca sempre tempestades. O Espiritismo foi combatido por numerosos adversários, por estar em oposição a quase todas as opiniões reinantes, pois que suas experiências demonstram a falsidade das teorias materialistas, a insuficiência dos sistemas espiritualistas, que desconhecem a verdadeira natureza da alma, e os erros dos ensinos religiosos relativos à origem e ao destino do princípio pensante. prodigalizam-se também insultos, zombarias, anátemas. Mas, levado pela irresistível força oriunda da observação científica, o Espiritismo despreza os ultrajes e, respondendo com fatos aos sofismas de seus contraditores, lança por terra os obstáculos acumulados em sua trajetória, e dia a dia conquista novos adeptos nas próprias fileiras de seus adversários. Quando inteligências como as de Crookes, Wallace, Varley, Lodge, Zöllner, Lombroso, Myers, Hodgson se veem obrigadas a reconhecer a incontestável realidade das relações entre os vivos e os pretensos mortos, a gente se sente em boa companhia e, assim, nem as calunias, nem os clamores rancorosos dos detratores da nova verdade serão capazes de impedir-lhe o triunfo definitivo.

            Comunicamo-nos com o Além, de maneira ininterrupta, através dos fenômenos da mesa, da escrita, da incorporação, das aparições. O túmulo deixou de causar-nos horror, porque ele, agora, é a porta que se abre para um mundo novo onde a vida é mais suave do que a daqui. A alma humana, em resposta aos negadores da sobrevivência, se revela após a morte com a mesma atividade que tivera na Terra, mostrando-se, até na chapa fotográfica, a esses doutores que jamais conseguiram encontrá-la sob seus escalpelos. Extraordinário prodígio o reconstruir ela, temporariamente, um corpo físico semelhante ao que possuía na vida terrena, e esta ressureição momentânea é o mais peremptório argumento suscetível de destruir os erros grosseiros do materialismo.

            A comunhão constante com a Humanidade desencarnada confirma a nossa imortalidade pessoal e permite-nos, outrossim, conhecer, sem vacilação, a verdadeira natureza da alma, levantando-se uma ponta do véu que ocultava sua origem e seus destinos.

            Que liberdade e que reconforto para o pensamento humano ao não se sentir mais descoroçoado pelos dogmas tão terrificantes como os do pecado original e das penas eternas! Que alívio concebermos o Ser Supremo sem aquelas feições de justiceiro implacável, a condenar ao suplício sem fim as miseráveis e fracas criaturas que somos nós! Felizmente, a realidade é mais nobre e grandiosa que essas  sombrias invenções da Teologia. A sorte de nossa eternidade futura não se decide nos curtos instantes de uma vida terrestre, ‘ondulação mal perceptível no imenso oceano das ideias’!

            A lei da evolução do princípio espiritual, cuja execução se processa por vidas sucessivas, permite-nos compreender o motivo das desigualdades morais e intelectuais que separam os filhos de um mesmo pai, a razão da existência, no mesmo globo, de selvagens e povos civilizados, de idiotas ao lado de gênios que são a glória de nossa raça. É pelos incontáveis e concordantes testemunhos dos que vivem no Espaço que sabemos não existir nem inferno nem paraíso e que somos os únicos artífices de nossos destinos futuros. É, lentamente, através de esforço ininterrupto, que desenvolvemos nosso ser espiritual, que ampliamos nossa inteligência, que penetram em nós os sentimentos do justo, do belo, do bem, e desaparecem os obscuros instintos do egoísmo, das baixas paixões e dos vícios, para darem lugar ao sentimento de fraternidade que nos aproxima desta Causa Primária que é todo amor.

            Allan Kardec, através de suas conversas com os Espíritos, não só deduziu toda essa nobre doutrina filosófica, senão que sua atenção foi ainda atraída para as manifestações extracorpóreas da alma encarnada.

            O mestre conheceu todos os fenômenos psíquicos, batizados hoje com novos nomes, e, classificando-os, determinou-lhes as causas. A transmissão de pensamento que, com o nome de telepatia, obteve grande repercussão em nossos dias, foi estudada em “O Livro dos Espíritos” e em “A Gênese”. A possibilidade de desdobramento do ser humano está indicada em “O Livro dos Médiuns”, com provas suficientes, e os casos muito interessantes de clarividência que se verificaram no passado, no presente e que se apreciarão no futuro, foram longamente descritos. na “Revue Spirite”. a Sociedade Inglesa de Pesquisas Psíquicas confirmou, através de investigações, a existência real desses fenômenos; os magníficos trabalhos de F.W. H. Myers nada mais são do que o sábio desenvolvimento das teorias que se encontram em gérmen nas obras de nosso mestre. E, entretanto, a obra do ilustre psicólogo inglês ainda está incompleta.

            Como simples hipótese verbal, a consciência subliminal não deve ter substrato material; parece-nos, pois, necessário ver no períspirito o órgão que serve a essas manifestações transcendentais.

           É ainda a Allan Kardec que devemos as primeiras e precisas noções a respeito do períspirito, corpo inseparável da alma. Inumeráveis observações, feitas sobre aparições de vivos e de mortos, afirmam de maneira categórica a sua existência.  

            O conhecimento desse organismo supra fisiológico faz do Espiritismo uma doutrina original, distinguindo-o nitidamente do espiritualismo religioso ou filosófico. O princípio inteligente não é mais uma abstração ideal, vaga entidade incorpórea; é um ser concreto, possuidor de sentidos especiais apropriados ao meio em que é chamado a viver após sua partida da Terra, isto é, no Espaço. Certas faculdades superiores da alma, tais como a telepatia e a clarividência, tem evidentemente a sua sede fora do cérebro, de vez que este é estranho às suas manifestações. Provavelmente, é no períspirito que vamos encontrar suas condições de existência, pois que se faz preciso a emancipação da alma para que elas se exerçam.

            Quanto mais estudarmos esse organismo superior, melhor lhe compreenderemos a importância para explicar certo número de problemas biológicos. A experimentação espírita tem uma utilidade de primeira ordem nesse particular, porquanto se torna indispensável submeter a exame cientifico a natureza e as propriedades deste corpo fluídico, para melhor lhe precisarmos a ação durante a vida e após a morte.

            As materializações dos Espíritos são fenômenos que põem em evidência esse mecanismo perispiritual, que dá à alma o poder de se apresentar diante de nós com os atributos anatômicos e fisiológicos da criatura terrestre. Se um ser do espaço é capaz de reconstituir momentaneamente a forma típica que tivera aqui embaixo – recebendo do médium parte de sua substância -,não será descabido supormos que a alma opera de maneira idêntica no nascimento, porém lentamente, segundo as leis da gestação, para que sua união com o corpo material seja durável. O ensino dos Espíritos, nesse ponto, está em concordância com a opinião de Claude Bernard, que claramente viu que a construção, manutenção e a reparação de um organismo vivo não revelam leis físico-químicas.

            ‘Vemos, diz ele, aparecer na evolução do embrião um simples esboço do ser antes de qualquer organização. Os contornos do corpo e os órgãos do ser permanecem detidos a princípio, iniciando-se as bases orgânicas provisórias que servirão de aparelhos funcionais temporários do feto.

            “Ainda não se distingue nenhum tecido. Toda a massa se constitui apenas de células plasmáticas e embrionárias. Mas neste bosquejo vital está traçado o desenho ideal de um organismo ainda invisível para nós, que assinala a cada parte e a cada elemento o seu lugar, sua estrutura e suas propriedades.”

            E, mais adiante, o eminente fisiologista precisa ainda mais seu pensamentos nestes termos:
“O que é essencialmente do domínio da vida e que não pertence nem à Física, nem à Química, nem a coisa alguma, é a ideia diretriz desta ação vital. Em todo gérmen vivo há uma ideia diretriz que se desenvolve e se manifesta pela organização. Durante toda a sua duração, o ser fica sob a influência dessa mesma força vital criadora, e a morte chega quando ela não se pode realizar... é sempre a mesma ideia que conserva o ser, reconstituindo as partes vivas, desorganizadas pelo exercício ou destruídas por acidentes ou enfermidades”.

            Nós que sabemos por experiência que a alma sobrevive à morte, que a vemos reedificar temporariamente o corpo, anatomicamente semelhante àquele que possuía na Terra estamos logicamente autorizados a supor que o períspirito contém a ideia diretriz que preside a edificação do corpo físico, de vez que o períspirito possui ainda esse poder de reconstrução após a morte.

            Não é tudo. Se a alma é o arquiteto de seu envoltório terrestre, possível será tirar-se desse fato uma confirmação da lei da reencarnação.

            Se é exato que o feto resume, nas primeiras semanas de vida intrauterina, todas as etapas percorridas pelos seres vivos depois da célula inicial; se, além disso, temos ainda em nós órgãos atrofiados, vestígios dos que foram úteis aos nossos ancestrais, deve-se concluir que o períspirito, que responde por essas formas desaparecidas e que afeiçoa e modela a matéria, passou outrora pelas organizações inferiores onde elas existiram; pois que, sem isso, ele, o períspirito, não poderia engendrá-los. Penso que seguindo essa direção os espíritas poderão encontrar, no estudo do ser humano, novas provas desta grande e magnífica verdade das vidas sucessivas, que já possui em seu ativo toda uma coleção e fatos relativos às recordações de existências anteriores, ou à predição de reencarnações que mais tarde se verificaram, tais como foram anunciadas.

            Os fatos espíritas receberam a consagração do tempo, resistiram a todos os métodos críticos a que foram submetidos, e, em nossos dias, com a evolução operada nas teorias científicas, vemo-las convergirem para as que Allan Kardec e os Espíritos sempre ensinaram. É com profunda alegria que verificamos o quanto as descobertas das ciências físicas  aproximaram estas desse mundo invisível com o qual começam assim a entrar em contato.

            As mais estranhas manifestações obtidas nas sessões espíritas não constituem atualmente fatos isolados. Os eflúvios que saem do corpo do médium, que atravessam obstáculos materiais, que impressionam chapas fotográficas, apresentam uma analogia evidente com os produtos da desmaterialização da matéria, gerados, por exemplo, pelos corpos radioativos. O corpo humano é um laboratório onde continuamente se realizam reações químicas muito intensas, as quais dão nascimento a produtos variados: emanações, raios catódicos, raios X, elétrons, poeiras de átomos em diferentes estados de desagregação. Estes resíduos estão eletrizados e constituem precisamente uma das formas mais grosseiras da substância fluídica, sob certos aspectos ainda material, mas, sob outros, imponderável. É muito provavelmente uma forma semelhante de desagregação carnal que serve, nas sessões de materialização, para produzir aparições temporárias de objetos (roupas, joias, etc.) que desaparecem, com a rapidez do relâmpago, tão logo deixe de agir a força que as originou.

            As experiências feitas com os eflúvios das substâncias radioativas dão força nova ao ensino de Allan Kardec sobre as criações fluídicas do pensamento. Com efeito, sabemos que o pensamento se traduz sempre por uma imagem; que a criação mental pode exteriorizar-se sob a forma de desenhos suscetíveis de adquirir a propriedade de se imprimirem sobre os corpos, produzindo modificações fisiológicas (sugestão de vesicatórios, de sinapismos, de queimaduras, etc.), desenhos esses que podem mesmo impressionar a chapa fotográfica (experiência do Comandante Darget). Sempre sustentei que só seria possível obter tal fenômeno se a sua imagem fosse uma realidade objetiva, isto é, fosse materializada. E interessante assinalar que o Sr. Le Bom pode reproduzir materializações temporárias com eflúvios de matéria dissociada. Eis o que ele diz sobre o assunto[1] :

            “Se desejamos estudar os equilíbrios de que são suscetíveis os elementos da matérias dissociada, substituamos um corpo radioativo por um ponta eletrizada  em conexão com um dos polos de uma máquina elétrica.

            “ Estas partículas estão submetidas às leis das atrações e repulsões que regem todos os fenômenos elétricos. Utilizando estas leis, conseguiremos obter, à vontade, os mais variados equilíbrios. Tais equilíbrios só por um instante podem ser mantidos. Se nos fosse possível fixa-los para sempre isto é, de maneira que eles pudessem sobreviver á causa geradora, criaríamos  com as partículas imateriais alguma coisa que se assemelharia à da matéria.

            “Mas se não podemos com coisas imateriais realizar equilíbrios capazes de sobreviverem à causa que os fez nascer[2], podemos, pelo menos, mantê-los o tempo suficiente para fotografá-los e criar assim uma espécie de materialização momentânea.

            “Utilizando unicamente as leis de que falamos mais acima, tivemos a sorte de agrupar as partículas de matéria dissociada, de modo a dar ao seu agrupamento todas as formas possíveis: linhas retas ou curvas, prismas, células, etc., que fixamos em seguida pela fotografia...

            “As formas poligonais, apresentam em algumas de nossas fotografias, não são, bem entendido, a reprodução de imagens planas, mas sim de formas com três dimensões, de que a fotografia pode dar a projeção. São, pois, figuras no espaço que obtivemos mantendo, momentaneamente, no equilíbrio que lhes impusemos, partículas de matéria dissociada.”

            No dia em que os sábios se resolveram a estudar cientificamente os fenômenos psíquicos, prometo-lhe estão algumas surpresas, mostrando que suas futuras descobertas já haviam sido previstas pelos Espíritos de quem eles ignoram tão profundamente as doutrinas.

            Um simples exemplo será suficiente para fazer ver que o Sr. Gustavo Le Bom – que justamente se orgulha pelo fato de haver demonstrado que a matéria retorna ao éter – não o primeiro a proclamar esta teoria, visto que ela se encontra nitidamente formulada por Allan Kardec em “A Gênese”, e isto em época em que essa hipótese era tida como monstruosa heresia cientifica.

            Eis o que foi escrito pelo mestre[3]:

            “Quem conhece, aliás, a constituição íntima da matéria tangível? Ela talvez somente seja compacta em relação aos nossos sentidos; prová-lo-ia a facilidade com que a atravessam os fluidos espirituais e os Espíritos, aos quais não oferece maior obstáculo do que os corpos transparentes oferecem à luz.
            “Tendo por elemento primitivo o fluido cósmico etéreo. à matéria tangível há de ser possível, desagregando-se[4], voltar ao estado de eterização, do mesmo modo que o diamante, o mais duro dos corpos, pode volatilizar-se em gás impalpável. Na realidade, a solidificação da matéria não é mais do que um estado transitório do fluido universal, que pode volver ao seu estado primitivo, quando deixam de existir as condições de coesão”.   

            A própria radioatividade foi pressentida nestes termos:

            “Quem sabe mesmo se, no estado de tangibilidade, a matéria não é suscetível de adquirir uma espécie de eterização que lhe daria propriedades particulares? Certos fenômenos, que parecem autênticos, tenderiam a fazer supô-lo. Ainda  não conhecemos senão a fronteira do mundo invisível; o porvir, sem dúvida, nos reserva o conhecimento de novas leis, que nos permitirão compreender o que nos conserva em mistério.”

            Sir Oliver Lodge, sobre o mesmo assunto, exprime-se assim perante a Sociedade de Física de Londres:

            “Não mais vamos admitir que o átomo seja permanente e eterno. A matéria provavelmente pode nascer e perecer. A história de um átomo apresenta analogias com a  de um sistema solar. Segundo a teoria elétrica da matéria, a combinação dos elétrons  pode produzir o agregado elétrico chamado átomo, cuja dissociação é acompanhada de um fenômeno de radioatividade.”

            W. Crookes, enfim, por sua vez, chega a uma análoga conclusão:

            “Essa fatal dissociação dos átomos, diz ele, parece universal. Ela se manifesta quando friccionamos um bastão de vidro, quando brilha o Sol, quando o corpo queima, quando a chuva cai, quando as vagas do oceano se quebram. E embora não seja possível calcular a data do desaparecimento do Universo, devemos constatar que o mundo inteiro retorna lentamente ao nevoeiro do caos primitivo. Nesse dia, o relógio da eternidade terminará seu ciclo.

            O acordo tardio que observamos entre as mais recentes afirmações da Ciência e as considerações proféticas de Allan Kardec sobre a constituição da matéria, assegura-nos que razão nos assiste em crer que os Espíritos que produzem fenômenos tão estranhos quanto a materialização e os transportes, estão mais adiantados do que nós no conhecimento das leis da Natureza. Aguardamos, confiantes, novas descobertas, pois certos estamos de que elas confirmarão cada vez mais as instruções de nossos guias espirituais. E nem poderia ser de outro modo, porque, sendo os fatos espíritas de incontestável realidade, a Ciência, mais hoje, mais amanhã, modificará suas conclusões teóricas, ampliando-as ou alterando-as, a fim de aí incluírem essas manifestações da atividade anímica, que havia ignorado.  

            O Espiritismo cumpre o seu objetivo, que é a demonstração da imortalidade, e isto o faz sem bravata nem fraqueza; tanto pior para as opiniões que ele contraria de passagem, hipóteses antigas que devem desaparecer ante os fatos novos.

            Trabalhemos, pois, com infatigável ardor no sentido de expandir esta nobre doutrina cuja ação salutar e fecunda é tão necessária em nossos dias. Proclamemos, por toda parte, não ser o túmulo o aniquilador do pensamento, abismo no qual nossa personalidade soçobraria, eclipsando-se para sempre. Demonstremos não ser verdade sejamos simples joguetes de leis inexoráveis e fatais, que pesariam sobre nós com a esmagadora impassibilidade desses ídolos antigos que, sob as rodas de seus carros, trituravam as carnes palpitantes de seus sectários. Afirmemos, alto e bom som, que a Natureza não seria tão irônica e cruel fazendo despertar nossa consciência para que melhor medíssemos o horror de nossa queda em o Nada. Estamos experimentalmente seguros de que a vida humana não é um relâmpago  entre duas noites profundas, mas simples etapa de ascensão eterna para a luz e para o amor.

            Temos a certeza de que as mais elevadas e santas aspirações de nossos corações não sofrerão os impactos da desilusão. Amanhã, iremos reencontrar os que, com sua partida, cavaram sulco cruel em nossas almas. Desta vez, a grande tradição espiritualista, tão velha como o pensamento humano, apoia-se inquebrantavelmente na Ciência, coisa alguma conseguirá entravar-lhe o voo, e a sua difusão no mundo será o marco de uma evolução moral, científica e social como jamais a Humanidade conheceu, desde a sua origem.     


[1]  Dr. Le Bom – “L’Evolution de la Matiére”, páginas 151 e seguintes.
[2] Os Espíritos chegaram a este resultado, W. Crookes conservou cabelos do Espírito materializado de Katie King.
[3] Allan Kardec – “A Gênese”, cap. XIV.
[4] Grifos do próprio Kardec.

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